Após aprovação sem emendas, orçamento de guerra será promulgado
Foto: Najara Araujo/Câmara dos Deputados
O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira, 6, em segundo turno, o texto do Senado para a chamada PEC do “orçamento de guerra” (Proposta de Emenda à Constituição 10/20), que permite a separação do orçamento e dos gastos realizados para o combate à pandemia de Covid-19 do orçamento geral da União.
A matéria será promulgada nesta quinta-feira, 7, pois as modificações feitas pela Câmara apenas excluíram trechos, sem itens novos. Para ser promulgada, uma emenda constitucional precisa ter o mesmo texto aprovado tanto pela Câmara quanto pelo Senado. Assim, o conteúdo aprovado atende a esse critério. A sessão do Congresso Nacional que vai promulgar a proposta será realizada às 15 horas.
Na votação em segundo turno, três partidos (PSol, Novo e PT) tentaram retirar outros trechos do texto, relatado pelo deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), mas os destaques, assim como na votação de primeiro turno, foram rejeitados.
Especificamente quanto à emergência do coronavírus, o texto determina que a União deverá adotar critérios objetivos e públicos em relação à distribuição a estados e municípios de equipamentos e insumos de saúde necessários ao enfrentamento da calamidade.
Ainda durante esse período de calamidade, os recursos obtidos com emissão de títulos para o refinanciamento da dívida pública mobiliária poderão ser utilizados também para o pagamentos de seus juros e encargos.
Nota técnica da Consultoria de Orçamento do Senado Federal aponta que essa flexibilização permitirá o uso do superávit financeiro de cerca de R$ 505 bilhões, apurado em dezembro de 2019 na fonte de recursos de refinanciamento da dívida, para o pagamento dos juros.
NARRATIVA – Parlamentares da Bancada do PT defenderam a proposta, argumentando que ela dá condições para o governo atuar com tranquilidade e segurança jurídica no combate ao coronavírus. O líder da Minoria, deputado José Guimarães (PT-CE), ao encaminhar o voto favorável à PEC, enfatizou que a Câmara estava dando todas as condições para o governo atuar com agilidade na preservação da vida nesse momento de crise sanitária. “Não vamos permitir que o governo Bolsonaro use a narrativa de que o Congresso atrapalha. Que nós não criamos as condições fiscais para que ele possa investir e gastar no combate ao Coronavírus, na defesa da vida”, enfatizou.
Na avaliação do deputado Rogério Correia (PT-MG), a aprovação do orçamento de guerra vai obrigar o governo a assumir a sua responsabilidade com a implantação de todas as medidas que estão sendo aprovadas no Congresso para ajudar o País a passar por esta crise, preservando vida. Ele destacou e defendeu a urgência no pagamento ao programa de renda emergencial para os mais vulneráveis com um auxílio de até R$ 1,2 mil por família.
“Não se pode dar desculpa ao presidente Jair Bolsonaro para descumprir as medidas aprovadas pelo Congresso, que asseguram renda mínima, garantia de emprego e que permite que a população mantenha o cumprimento do isolamento social”, reforçou Rogério Correia.
Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
COMPRA DE TÍTULOS – O ponto mais questionado nas discussões do segundo turno foi a permissão dada ao Banco Central para comprar e vender títulos públicos e privados. Segundo o governo, o mecanismo pretende injetar recursos na economia e vai funcionar durante o período do estado de calamidade pública, embora a venda possa ocorrer posteriormente. O Banco Central poderá comprar e vender títulos do Tesouro Nacional, nos mercados secundários local e internacional, e também direitos de crédito e títulos privados no âmbito de mercados secundários nos setores financeiro, de capitais e de pagamentos.
TÍTULOS PRIVADOS – O texto do Senado restringe as negociações ao mercado nacional e a títulos que, no momento da compra, tenham classificação de risco equivalente a BB- ou maior por, ao menos, uma das três maiores agências de classificação. O preço de referência do ativo deve estar publicado por entidade do mercado financeiro homologada pelo Banco Central. As três maiores agências de classificação de risco são a Moody’s, a S&P (Standard & Poor’s) e a Fitch. A classificação BB- é intermediária no grupo de investimentos de risco.
O texto aprovado, segundo o relatório de Motta, retirou a lista dos tipos de títulos que poderiam ser comprados pelo BC se possuidores dessa classificação de risco. Ele manteve, entretanto, a preferência para os emitidos por micro, pequenas e médias empresas. Deputados contrários à compra de títulos privados argumentaram que essas empresas não terão dinheiro para pagar o serviço das agências para classificar seus títulos, fazendo com que eles fiquem de fora das negociações do BC.
CONTRAPARTIDAS – Para poder vender os títulos ao Banco Central, o detentor deverá seguir exigências de contrapartida estipuladas em regulamento pelo BC. Entre as contrapartidas, o texto prevê a proibição de as instituições financeiras pagarem juros sobre o capital próprio (para os sócios) ou dividendos acima do mínimo obrigatório estabelecido em lei ou no estatuto social vigente na data de entrada em vigor da futura emenda constitucional. Não poderá haver aumento da remuneração, fixa ou variável, de diretores e membros do conselho de administração, no caso de sociedades anônimas (S.A.); e de administradores, no caso de sociedades limitadas (Ltda.). Essa remuneração variável inclui bônus, participação nos lucros e quaisquer parcelas adiantadas e outros incentivos associados ao desempenho.
PUBLICIDADE – O Banco Central deverá publicar diariamente as operações realizadas, de forma individualizada, com todas as informações, incluindo condições financeiras e econômicas das operações, como taxas de juros pactuadas, valores envolvidos e prazos. Terá ainda de prestar contas ao Congresso Nacional a cada 30 dias, em vez dos 45 dias previstos no texto da Câmara dos Deputados. Entretanto, o Senado retirou do texto a previsão de que o Tesouro Nacional entraria com um capital mínimo de 25%.
BENEFÍCIOS TRIBUTÁRIOS – Embora o Senado tenha incluído na PEC dispositivo que condicionava o recebimento de benefícios creditícios, financeiros e tributários, direta ou indiretamente, ao compromisso das empresas de manterem empregos, o texto aprovado excluiu esse ponto, seguindo o relatório de Motta.
Por outro lado, o texto aprovado prevê que, durante a vigência da calamidade pública nacional, será suspensa a proibição constante da Constituição de que empresa com dívida perante a Seguridade Social não pode contratar com o poder público ou dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.
COMITÊ DE CRISE – A versão do Senado Federal para a PEC exclui o Comitê de Gestão de Crise, que seria composto por autoridades do Poder Executivo, sob comando do presidente da República, e também por representantes das áreas de saúde e assistência social de estados e municípios. Pelo texto da Câmara dos Deputados, caberia ao comitê aprovar as ações com impacto orçamentário relacionadas ao enfrentamento do coronavírus. A versão dos senadores mantém a permissão para a contratação, por processos simplificados, de pessoal temporário, de obras, serviços e compras relacionados exclusivamente ao enfrentamento da situação de calamidade pública.
Atos do Poder Executivo e propostas legislativas que não impliquem despesa permanente ficarão dispensados de limitações legais sobre criação e expansão de despesas durante o período da calamidade.
REGRA DE OURO – A proposta dispensa o Poder Executivo de pedir ao Congresso Nacional autorização para emitir títulos que violem a chamada “regra de ouro”. Isso será válido enquanto durar o estado de calamidade. Essa regra proíbe a realização de operações de crédito (emissão de títulos) com valor que supere as despesas de capital (investimentos e amortizações). A novidade no texto do Senado é que o Ministério da Economia deverá publicar, a cada 30 dias, relatório contendo os valores e o custo das operações de crédito realizadas no período de vigência da calamidade.
CRÉDITOS EXTRAORDINÁRIOS – A versão do Senado para a PEC 10/20 retira do texto o prazo de 15 dias úteis para o Congresso Nacional se manifestar quanto à pertinência e urgência de créditos extraordinários editados. O texto dos senadores, no entanto, especifica que as autorizações de despesas deverão constar de programações próprias e serão avaliadas em separado na prestação de contas da execução orçamentária que o Executivo deve enviar bimestralmente ao Parlamento.
* Com informações da Agência Câmara.