Após fogo no Pantanal, Frente Agropecuária quer suspensão de dívidas de pecuaristas
Foto: Mayke Toscano/Secom-MT
A floresta e os animais carbonizados pelos incêndios provocados por fazendeiros, que atingiram em setembro a maior média histórica no Pantanal, ainda nem esfriaram. Mas a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) já se mobiliza na Câmara dos Deputados para obter vantagens. Os focos de incêndio na região ultrapassarem 16 mil em um ano pela primeira vez naquele mês, destruindo 15% do bioma em uma área superior a 2 milhões de hectares. Quatro fazendeiros foram indiciados pela Polícia Federal pelo início das queimadas na região da Serra do Amolar, no Pantanal de Mato Grosso do Sul. O inquérito foi enviado ao Ministério Público Federal (MPF).
Na última segunda-feira, o deputado Dagoberto Nogueira (PDT-MS) protocolou o Projeto de Lei 4555/20 que suspende, por 36 meses, o pagamento de financiamentos contratados por pecuaristas da região do Pantanal nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
Pela proposta, o montante não pago no período será dividido em três parcelas iguais, a serem pagas, anualmente, a partir de 12 meses após o fim da suspensão. O texto está tramitando na Câmara e deve ir a plenário nas próximas semanas. O projeto não informa os valores envolvidos no pedido de moratória.
De acordo com o Balanço de Financiamento Agropecuário da Safra 2019/2020, divulgado em novembro do ano passado pela Secretaria de Política Agrícola (SPA) do Mapa, com base nos dados do Sistema de Operações do Crédito Rural e do Proagro (Sicor), do Banco Central, as contratações das operações de crédito rural de julho a outubro daquele ano somaram R$ 77,35 bilhões, alta de 4% na comparação com a safra anterior. Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), as operações de custeio alcançaram R$ 46,1 bilhões (+ 6%), investimento, R$ 17,5 bilhões (+8%), comercialização, R$ 8 bilhões (-26%) e as de industrialização, R$ 5,5 bilhões (+62%).
A justificativa do pedetista é amenizar os impactos da seca e dos incêndios que atingiram a região pantaneira neste ano. Algumas regiões do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul ficaram sem chuva por mais de cem dias e os incêndios já devastaram cerca de 30% de toda a área do bioma Pantanal.
“Esses acontecimentos prejudicaram os processos de enxerto e desmame, havendo projeção de uma safra menor de bezerros para o próximo ano. Além disso, são esperados animais com peso e qualidade baixos”, argumenta o parlamentar.
Ele disse ainda que está preocupado com o que pode acontecer a partir de agora. “Fica claro que os produtores da região pantaneira passarão por dificuldade financeira no próximo ano, havendo especial preocupação com a capacidade deles para quitar parcelas de financiamentos decorrentes de diversos programas de crédito rural”, defende.
O projeto de Nogueira atinge os programas de Incentivo à Irrigação e à Produção em Ambiente Protegido (Moderinfra), de Incentivo à Inovação Tecnológica na Produção Agropecuária (Inovagro), de Desenvolvimento Cooperativo para Agregação de Valor à Produção Agropecuária (Prodecoop), de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp), Fundo Constitucional do Centro Oeste, Capitalização das Cooperativas de Produção Agropecuária (BNDES – Procap-Agro), BNDES Agro, BB Investe Agro e Financiamentos de Custeio Pecuário.
CRÉDITO – No início de novembro, o Grupo de Trabalho do Conselho de Desenvolvimento Econômico de Mato Grosso (Codem), criado pelo governo do estado para solucionar problemas causados à economia pecuária no Pantanal mato-grossense, anunciou a abertura de linhas de crédito para pecuaristas e projetistas atingidos por incêndios na região. Serão remanejados R$ 170 milhões em recursos do FCO Empresarial para o FCO Rural, com uso preferencial para produtores rurais do Pantanal. O plano emergencial de recuperação da pecuária pantaneira compreende o período de pós-incêndio até 30 de dezembro de 2020.
Parlamentar defendeu cassinos em áreas indígenas
Foto: Luís Macedo/ Câmara dos Deputados
O autor do projeto comandou as articulações do Centrão por cargos no governo Bolsonaro. Deputado desde 2006, Nogueira perdeu a eleição ao Senado em 2010 e foi reeleito para a Câmara em 2018. Integrante da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), ele é autor de um projeto de 2017 que defende a criação de cassinos em áreas indígenas e também propôs o fim dos grupos técnicos para identificação e delimitação de terras tradicionalmente ocupadas pelos Guarani, no Mato Grosso do Sul. Nogueira é um dos 50 parlamentares anti-indígenas listados em setembro pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Pedido de restauração em terra já desmatada
Um levantamento do portal De Olho nos Ruralistas publicado em novembro de 2018 apurou que o parlamentar possui uma área de 2.249 hectares de terras em Miranda, com a Fazenda Mariana, adquirida em 1998. Em 2009, ele requereu ao Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul um Termo de Averbação Provisória de Reserva Legal para uma área de 121 hectares. E um Termo de Compromisso de Restauração de Reserva Legal “para área inexistente de 222 hectares”, segundo o Imasul. “Ou seja, a área tinha sido desmatada”, constata a apuração.
Patrimônio triplicou em 16 anos
Nas eleições de 2002 para a Assembleia Legislativa, o deputado paulista de São José do Rio Preto declarou um patrimônio de R$ 953 mil como servidor público estadual. Naquela época, a fazenda Mariana tinha 655 hectares. Ele possuía ainda a fazenda Santa Verônica, com 649 hectares, no município vizinho de Anastácio, também no oeste do estado. Em 2006, ainda com a Fazenda Santa Verônica, Nogueira informou que era proprietário de 1.066 hectares na Fazenda Mariana, mas em vez de Miranda o município apontado era Aquidauana, na mesma região. O patrimônio do deputado já somava R$ 1,38 milhão.
Em 2010, ele declarou R$ 2,84 milhões em bens, puxados pela fazenda Mariana, mas não informou o tamanho do imóvel naquele ano. O preço da fazenda, no entanto, foi majorado de R$ 502 mil para R$ 1,8 milhão. Em 2011, o político foi alvo de ação na Justiça Federal por desvio milionário em recursos do DPVAT, seguro obrigatório pago para acidentes de trânsito, no período em que foi dirigente do Departamento Estadual de Trânsito.
De acordo com o portal, em 2012, Nogueira foi derrotado nas eleições à prefeitura de Campo Grande e viu o patrimônio baixar para R$ 2,6 milhões. Declarou que a fazenda Mariana tinha 2.203 hectares. No mesmo ano, o deputado recebeu R$ 225 mil de empresas e pessoas ligadas ao agronegócio. Entre seus principais doadores, a JBS repassou R$ 170 mil. Na declaração de bens de 2018, quando foi reeleito deputado federal, o patrimônio declarado saltou para R$ 3,09 milhões.