Ex-ministro da Saúde tenta blindar Bolsonaro na CPI, mas apresenta contradições
Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
“Missão cumprida”. Assim resumiu o ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, ao ser indagado nesta quarta-feira, 19, sobre os motivos de sua demissão do cargo pelo presidente Jair Bolsonaro. O homem que passou mais tempo à frente da pasta durante a pandemia protagonizou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado, um depoimento que foi considerado não objetivo, prolixo, pela maior parte dos senadores integrantes.
Foto: Edilson Rodrigues /Agência Senado
Pazuello, que deixou o ministério com o país registrando mais de 270 mil mortes em sua gestão, chegou acompanhado pelo filho 01 do presidente da República, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).
O ex-ministro buscou em suas respostas isentar o mandatário das responsabilidades no trato da crise sanitária. O momento mais tenso durante os questionamentos iniciais feitas pelo relator Renan Calheiros (MDB-AL) ocorreu quando ele foi questionado sobre o desabastecimento de oxigênio em Manaus (AM).
“O senhor está aqui protegido por um habeas corpus. Agora, não pense que faltar com a verdade, não vá ter consequências mais adiante. Por que nós não vamos parar aqui”, advertiu o amazonense Omar Aziz, do PSD, presidente da CPI.
O ex-ministro da Saúde afirmou que ficou sabendo da crise apenas na noite do dia 10 de janeiro, e que poderia ter agido antes. No entanto, ao dar entender que o problema durou três dias, foi rebatido imediatamente pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM).
Mentiras
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“A informação é mentirosa! Não faltou oxigênio em Manaus por dois ou três dias. Faltou por mais de 20 dias e o senhor estava lá. Viu com seus olhos os amazonenses morrendo por falta de oxigênio”, frisou indignado ao ainda lembrar: “Antes a gente ficava dependendo da ajuda do Gusttavo Lima, do Paulo Gustavo”.
O auxílio do governo da Venezuela que enviou caminhões de oxigênio em uma missão humanitária também foi registrado por senadores.
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Eles lembraram que, em nenhum momento, o governo brasileiro sequer agradeceu a atitude.
Pazuello também não convenceu os integrantes da CPI quando atribuiu a famosa frase “é simples assim: um manda, outro obedece” a um jargão militar e disse que a usou em um contexto jocoso para as redes sociais.
O ex-ministro ainda disse que as declarações de Bolsonaro de cancelar as tratativas para a aquisição da vacina Coronavac pelo Instituto Butantan, de São Paulo, foi dada em um contexto político no qual o presidente teria reagido a um vídeo do governador daquele estado, João Dória (PSDB-SP).
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“Nunca o presidente mandou eu desfazer qualquer contrato, qualquer acordo com o Butantan. Ele (Bolsonaro) nunca falou um ‘ai’ sobre o Butantan. Uma postagem na internet não é uma ordem”, alegou o ex-ministro à CPI.
À tarde os ânimos já começavam a ficar mais acirrados na audiência, Pazuello tentou se esquivar de novos questionamentos sobre o episódio em que o ex-ministro foi desautorizado por Bolsonaro em relação à aquisição de vacinas. “Não extraio ordens do presidente pelas redes sociais”, desconversou o general. Foi repreendido por Eliziane Gama. “Eu tenho a sensação que o senhor está aqui tirando com a nossa cara”, irritou-se a senadora maranhense do Cidadania.
Ele atribuiu à secretária do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, conhecida como “capitã cloroquina”, a criação da plataforma TrateCov, que recomendava uso de cloroquina até para bebês. “Os médicos estavam usando off label. Senhores, o Ministério da Saúde tinha uma nota para usarem cloroquina na fase em que estava morrendo gente. Precisávamos fazer alguma coisa”, justificou.
Acareações
Ao responder aos senadores, o general ainda disse que, ao contrário dos depoimentos dados pelo ex-secretário de Comunicação de Bolsonaro, Fabio Wajngarten, e Carlos Murillo, presidente da Pfizer para a América Latina, o ministério não teria deixado a farmacêutica sem respostas em sua proposta de oferta de vacinas contra a covid-19. Entre os integrantes da CPI já circula a ideia de promover uma acareação entre os depoentes.
Também causou estranheza aos senadores o fato dos então ministros Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) e Nelson Teich terem dito que saíram do cargo por pressões de Bolsonaro que queria intensificar o uso da cloroquina no Brasil. “Nós temos depoimentos de dois ex-ministros que saíram porque houve pressão do presidente e com o senhor nada?”, ironizou o relator Calheiros.
Planalto comemora por enquanto
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Segundo analistas políticos, até o momento os senadores que integram a CPI teriam sido pegos de surpresa, pois apostavam que Pazuello iria se valer do habeas corpus do STF que lhe dava o direito de ficar em silêncio e não fazer uso de mentiras para se desvenciliar das acusações.
No entanto, aos poucos as contradições começam a aparecer e até o final da oitiva, com o ex-ministro sendo pressionado cada vez mais, poderão se tornar ainda mais evidentes.
Um exemplo é uma nota recentemente emitida pelo Tribunal de Contas da União (TCU) que rebate a afirmação de Pazuello de que o próprio Tribunal de Contas teria se posicionado contrário à compra das vacinas da Pfizer.
“O TCU informa que em nenhum momento seus ministros se posicionaram de forma contrária à contratação da empresa Pfizer para o fornecimento de vacinas contra a Covid, e tampouco o tribunal desaconselhou a imediata contratação em razão de eventuais cláusulas contratuais”, diz a nota. O TCU retirou da pauta desta quarta-feira o julgamento que trata das ações do ex-ministro no combate à pandemia.
Sangramento
A sessão estava prevista para retornar após a leitura do Ordem do Dia do Senado, mas foi transferida para amanhã, 20. O motivo foi um mal súbito de Pazuello que acabou sendo socorrido pelo senador Otto Alencar (PSD-BA) que é médico. Segundo Alencar o que aconteceu com o ministro foi uma síncope que ocasionou um sangramento. Algo comum em pessoas que ficam muito tempo sentadas ou sob tensão.