Senadores pressionam ex-ministros de Bolsonaro sobre kit-covid e imunidade de rebanho
Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Segundo dia de audiências da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19 no Senado ouve o ex-ministro da Saúde Nelson Teich. Conclui-se assim as oitivas dos que estiveram à frente da pasta antes da era Pazzuello.
O ex-ministro Nelson Teich afirmou nesta quarta-feira, 5, que o seu pedido de demissão após curto período no comando do Ministério da Saúde se deu porque percebeu que não teria a autonomia necessária para “implementar aquilo que considerava correto” no enfrentamento da pandemia. A ideia do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de expandir a indicação da cloroquina para o tratamento da enfermidade foi pontual, mas pesou em sua decisão.
Teich ficou exatamente 29 dias como titular da pasta. Ele substituiu Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) que entrou em rota de colisão com Bolsonaro. O primeiro ministro da Saúde do atual governo federal foi ouvido pelos senadores da CPI na terça-feira, 4, por mais de sete horas.
Pazzuello em quarentena
A ideia inicial da CPI era que Mandetta e Teich fossem inquiridos no primeiro dia de depoimentos. No entanto, como o também ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, alegou que não poderia comparecer à CPI como programado para esta quarta-feira, a agenda foi remarcada.
O general de Divisão do Exército afirmou que teve contato com dois coronéis infectados com o coronavírus. Seu depoimento agora está previsto para o próximo dia 19.
Assumindo o Ministério da Saúde com, na época, nove mil mortos pela covid-19, Pazzuello deixou um legado de quase 400 mil óbitos. Por isso, o militar é um dos depoentes mais aguardados.
Estratégia de Bolsonaro
Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Momento forte do depoimento foi quando o senador Humberto Martins (PT-PE) questionou a opinião de médico Teich sobre a posição do Conselho Federal de Medicina (CFM) que ainda mantêm a defesa dos remédios que compõem o chamado kit-Covid como de livre prescrição médica.
“Uma postura inadequada”, disse, cuidadosamente, Teich que, mais tarde, foi obrigado a ser mais taxativo ao responder uma série de questionamentos sobre o mesmo assunto formulados por outros senadores e integrantes da chamada tropa de choque de Bolsonaro na CPI. “Se a coisa não funciona e apresenta riscos, não se deve agregar o risco”, pontuou. Teich disse inicialmente que até houve uma certa euforia mundial com a possibilidade de tais receituários que, mais tarde, foram comprovados ineficazes.
O senador Martins informou que já fez a requisição para que o atual presidente do CFM, Mauro Ribeiro, preste depoimento à comissão.
Crime doloso
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Outra requisição que deverá ser feita é para que seja ouvido na CPI o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), considerado uma das pessoas que ao lado dos filhos do presidente participava do grupo de assessoramento paralelo a Bolsonaro, citado no depoimento de Mandetta. Terra foi um dos principais defensores da tese da Imunidade de Rebanho, uma alternativa fomentada pelo governo para acabar com a crise sanitária no país.
É uma hipótese que cientificamente não se confirma, segundo Teich. “Não há imunização de rebanho sem vacinação”, disse.
Para Martins, “se ficar comprovado que o presidente apostou numa imunização de rebanho e decidiu não usar recursos para enfrentar adequadamente a pandemia, estaremos diante de um crime doloso que ceifou a vida de milhares de brasileiros”, completou o senador.
Bula fake para cloroquina
Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
O ex-ministro Mandetta inaugurou ontem os depoimentos da CPI. Ao todo, ele permaneceu durante sete horas e 22 minutos ouvindo os questionamentos e passando o seu entendimento aos senadores sobre a pandemia no Brasil. Na ocasião foram abordados temas como testagem, vacinação, ciência e negacionismo.
Para o ex-ministro, as posturas de Bolsonaro causaram “impacto” no agravamento da crise sanitária.
Além de um grupo paralelo ao Ministério da Saúde que atuava ao lado do presidente, Mandetta denunciou que se deparou até com uma minuta de decreto para alterar a bula da cloroquina.