Audiência pública aponta contradições na criação de unidades regionais de saneamento
Foto: ALRS/ Divulgação
Foto: ALRS/ Divulgação
Deputados da Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa do RS (Alergs) debateram em audiência pública remota realizada na manhã desta quinta-feira, 30, o Projeto de Lei 234 /2021. A proposta está em tramitação no legislativo e prevê a criação de Unidades Regionais de Saneamento Básico no âmbito do processo de privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan). O encontro contou com a participação de gestores municipais e especialistas em saneamento.
A Comissão decidiu enviar ao relator do projeto na Casa, deputado Elizandro Sabino (PTB), recomendações para que o governo adote critérios das bacias hidrográficas na definição das unidades regionais, assegure autonomia aos municípios, apresente um plano estadual de saneamento e a planilha de investimentos previstos em cada município.
Na abertura dos trabalhos, o proponente da audiência e vice-presidente da comissão, deputado Jeferson Fernandes (PT), explicou que o projeto refere-se aos 190 municípios que não têm cobertura da Corsan, “ou porque têm empresas próprias de saneamento, ou porque já privatizaram o serviço, como Uruguaiana e São Gabriel, ou ainda porque têm o serviço prestado diretamente pela prefeitura ou por uma associação comunitária, como a maioria dos municípios pequenos”. O projeto que trata da regionalização da Corsan, esclareceu o deputado, é o PL 210/2021.
O líder da bancada do PT, deputado Pepe Vargas (PT), disse que o projeto induz a privatização dos serviços de saneamento, o que, segundo ele, é uma experiência fracassada em nível internacional, uma vez que países que a adotaram estão revertendo o processo. No desenho proposto no estado, conforme o parlamentar, não há qualquer critério para a forma como os municípios foram agrupados em unidades regionais.
O prefeito de São Leopoldo, Ary Vanazzi (PT), disse que há uma proposta construída entre os vários comitês de bacias como alternativa ao projeto em tramitação na Assembleia, defendida pela Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre (Granpal).
“Precisaríamos fazer um debate completo sobre o tema do saneamento se a ideia for tratar com seriedade o tema”, disse. “Se essas questões não andarem juntas, o serviço ficará pela metade e as soluções também”, alertou. Vanazzi questiona o prazo até 2033 para a universalização do saneamento. “Não há condição nenhuma, técnica ou financeira, para universalizar o saneamento até 2033, nem pela iniciativa privada”, disse.
Alternativas
Foto: ALRS/ Divulgação
O coordenador-geral do Observatório Ondas Brasil, Marcos Montenegro, que acompanha experiências desenvolvidas nos vários estados destacou que o estado pode lançar mão de proposta de lei complementar e criar microrregiões nas quais a adesão é obrigatória ou criar unidades regionais, como no caso do RS, com adesão voluntária. “O que nos chama a atenção particularmente no PL 234 é um esquema de governança que praticamente aliena os municípios da decisão e a transfere para o organismo de governança colegiado”, disse.
Montenegro também apontou que em alguns estados, como Alagoas, a decisão foi pela concessão com base no critério de pagamento de outorga, ou seja, a concessionária paga para os titulares do serviço, o que acaba por onerar a tarifa. “Assim, achamos que não deve ser cobrada a outorga para eventual concessão”, defendeu.
O engenheiro José Homero Finamor Pinto, da Associação dos Técnicos da Corsan, acrescentou que em 45 anos na empresa viu apenas dois planos federais de investimentos em saneamento, o Planasa e o PAC, e que “agora o governo tentava passar (o assunto) para a iniciativa privada, como se fosse resolver”. Para o engenheiro, o estado “não fez o dever de casa” e “no apagar das luzes” apresentava um projeto de privatização sem qualquer critério ou planejamento.
A presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Caxias do Sul (Sindiserv), Silvana Pirolli, disse partilhar de muitas das ideias contidas na fala do prefeito, lembrando que a água “não é mercadoria” e que “saneamento significa saúde pública”. O diretor-presidente do Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto (Samae) do município, Gilberto Meletti, disse que a autarquia pretende seguir atendendo à população nos moldes atuais.
O presidente do Sindiágua, Arilson Wünsch, disse acreditar que a Lei 14.026/2020 seria considerada inconstitucional e reforçou falas anteriores sobre a inviabilidade técnica da universalização do serviço de saneamento. “Só se evacuar a cidade, fizer todos os serviços, e depois devolvê-la”.
O assessor jurídico da Famurs, Rodrigo Westphalen, disse que, desde o início do processo de privatização da Corsan, a entidade promove espaços de diálogo como entidade multipartidária, tendo realizado quase uma dezena de encontros sobre o tema para oferecer aos gestores o máximo de informações possível.
Para o ex-deputado e ex-prefeito de Novo Hamburgo Tarcísio Zimmermann (PT), o sistema proposto pelo governo é arbitrário e visa sustentar a privatização dos serviços.
O deputado Zé Nunes (PT) defendeu a resistência jurídica e política à lei “criada para viabilizar o monopólio do setor privado na área do saneamento”. Ele aposta que o STF aponte a ilegalidade da lei.