Senado derruba MP com minirreforma trabalhista
Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado
O Plenário do Senado rejeitou na noite de quarta-feira, 1º, a Medida Provisória (MP) 1.045/2021, que originalmente criou novo programa de redução ou suspensão de salários e jornada de trabalho durante a pandemia de covid-19, mas sofreu tantos acréscimos na Câmara dos Deputados que foi chamada de “minirreforma trabalhista” por senadores. Foram 47 votos contrários, 27 votos favoráveis e uma abstenção. Com essa votação, os senadores impõem mais uma derrota ao governo Bolsonaro. A MP 1.045/2021 será arquivada.
O texto original da MP, editado pelo presidente da República, no final de abril, instituiu o novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, em moldes parecidos aos do ano passado.
A iniciativa trouxe medidas trabalhistas para o enfrentamento da emergência em saúde pública provocada pelo coronavírus, no intuito de garantir a continuidade das atividades empresariais, com permissão de redução de salários e suspensão de contratos de trabalho. A MP 1.045/2021 foi publicada no Diário Oficial da União em 28 de abril. Na prática, a MP precarizava ainda mais os direitos trabalhistas e abria caminho para a hiperexploração da mão de obra, instituindo a figura do trabalhador de segunda categoria.
O programa instituiu o Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, pago pela União nas hipóteses de suspensão ou redução da jornada de trabalho, independentemente do cumprimento de período aquisitivo, do tempo de vínculo empregatício ou do número de salários recebidos. A MP estabeleceu, também, a possibilidade de redução da jornada de trabalho e do salário dos empregados e suspensão temporária dos contratos de trabalho, juntamente com o pagamento do benefício, por até 120 dias. Todas as ações tomadas durante a vigência da MP até agora continuarão válidas.
Na Câmara dos Deputados, a MP foi aprovada na forma do PLV 17/2021, apresentado pelo deputado Christino Aureo (PP-RJ), que acatou várias emendas e incluiu outros temas no texto.
Com as modificações na Câmara, o PLV passou a instituir três novos programas de geração de emprego e qualificação profissional: o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip) e o Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário; além de alterar a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), o Código de Processo Civil e uma série de outras leis.
Novos Programas
Em seu voto, o relator no Senado, senador Confúcio Moura (MDB-RR), retirou todas as alterações na CLT e manteve a criação dos três novos programas de geração de emprego, mas a maioria dos senadores preferiu rejeitar a matéria como um todo, temendo que a MP voltasse para a Câmara e os deputados federais reintroduzissem os chamados “jabutis”.
Com isso, também caíram as mudanças propostas pelos deputados em relação à jornada de trabalho de mineiros e em relação ao direito à gratuidade na Justiça trabalhista. “O Brasil tem alto histórico de informalidade, que é ainda maior nas Regiões Norte e Nordeste, especialmente no Maranhão, 64%, enquanto em Santa Catarina são 23%, em Rondônia, 46% e, no Amazonas, 61% de informalidade, valores astronômicos.
A informalidade é mais alta em jovens de 18 a 29 anos. A pandemia já produziu, infelizmente, 14,8 milhões de desempregados, 14,7% da força de trabalho brasileira. Apenas um terço da força de trabalho é formal no Brasil, um terço. Os jovens são os que mais sofrem numa crise de recessão. Efeito cicatriz traz prejuízo ao longo de toda a vida laboral de quem entra no mercado de trabalho neste momento”, disse.
Vários senadores sugeriram que o governo agora envie ao Congresso projetos de lei tradicionais para a criação desses novos programas.
Pedidos de impugnação
Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado
Antes da votação, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, rejeitou pedidos de impugnação feitos por diversos senadores referentes aos dispositivos acrescidos pelos deputados na MP. Os senadores alegaram que esses acréscimos não tinham pertinência temática com o texto original do Executivo e criticaram a tentativa de promover tantas mudanças trabalhistas por meio de MP, e não de projeto de lei.
Pacheco rejeitou a alegação, disse que a apresentação de emendas é inerente à atividade parlamentar e que eventuais impugnações em MPs deve se restringir a dispositivos que não guardem nenhuma pertinência temática com o texto original, o que não seria o caso no seu entendimento. Para ele, as mudanças promovidas pela Câmara relacionavam-se de modo direto à MP original, pois também regulavam relações de trabalho.
“Embora não previstos originalmente, os dispositivos guardam conexão com o objeto da MP. Indefiro os requerimentos de impugnação de matéria estranha”, disse Pacheco.
Ao pedir a impugnação de todas as alterações promovidas pelos deputados federais, o senador Paulo Paim (PT-RS) afirmou que as novidades precisavam ser mais debatidas no Parlamento e com a sociedade. Ele disse que havia “cerca de 70 jabutis” no PLV que criavam novos programas “que não foram debatidos com ninguém, autônomos e desvinculados do programa emergencial de manutenção de renda”.
O senador José Aníbal (PSDB-SP) disse que o texto original do Executivo tinha 25 artigos e saiu com 94 artigos da Câmara. Paulo Rocha (PT-PA) afirmou que desde o governo de Michel Temer as relações de trabalhos estão sendo precarizadas e o desemprego continua alto.
Mobilização e organização sindical
As centrais sindicais comemoraram a derrota da minirreforma do governo e atribuíram a rejeição à matéria à mobilização dos movimentos sociais, que pressionaram o Congresso contra a medida. “A derrota desta nefasta artimanha do governo resulta da organização das entidades sindicais, da unidade das centrais sindicais, da persistência dos sindicatos, federações, confederações, que não pouparam esforços em buscar um diálogo com o Senado e expor rapidamente os prejuízos sociais e econômicos contemplados na medida”, afirmam em nota.
“A rejeição pelo Senado dessa medida absurda é resultado e vitória do trabalho institucional muito bem feito e bem organizado pelo movimento sindical dentro do Congresso Nacional, uma conquista da unidade das centrais sindicais”, afirma Sérgio Nobre, presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Como não existe governo federal, complementa, “tivemos de ir para dentro do Parlamento, pressionar e atuar diretamente junto a deputados federais e senadores para debater e lutar contra as matérias que afetam diretamente o mundo do trabalho e atacam os direitos da classe trabalhadora”.
Segundo o dirigente, a MP 1045 era inconstitucional, sem lógica, prejudicava o desenvolvimento do país, ao tentar trazer de volta “a famigerada carteira verde amarela, uma carteira de trabalho sem direitos nenhum e trabalho sem direitos é escravidão”. “Somente empregos de qualidade garantem o desenvolvimento de uma nação”.
Sérgio Nobre destacou que a pressão das bases sindicais nas ruas foi também determinante para a rejeição da medida. Segundo o dirigente, essa pressão tem que continuar, aumentar e se fortalecer.