POLÍTICA

Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações diz ser possível voltar atrás na decisão de extinção do Ceitec

Proposta de Paulo Guedes de extinção do Ceitec, única empresa da América Latina capaz de projetar e produzir semicondutores de silício, vai na contramão da crescente demanda por semicondutores no mundo
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 29 de julho de 2022

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Foto: Marcus Perez/CUT

Manifestação dos trabalhadores do Ceitec em frente ao Palácio Piratini, sede do governo do estado do RS, em 2021

Foto: Marcus Perez/CUT

Sob o argumento da crise mundial de produção de semicondutores, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) diz ser possível uma volta atrás na decisão do governo de extinguir o Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec).

Única empresa da América Latina capaz de projetar e produzir semicondutores de silício, a estatal com sede em Porto Alegre, foi colocada em processo de liquidação (extinção) no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do Ministério da Economia comandado por Paulo Guedes.

Segundo o diretor do Departamento de Ciência, Tecnologia e Inovação Digital do MCTI, Henrique de Oliveira Miguel, a pasta agora comandada por Paulo Alvim – após a desincompatibilização do astronauta Marcos Pontes para concorrer às eleições – deve iniciar uma conversa com a equipe econômica.

A informação foi detalhada na terça-feira, 26, no painel A falta de semicondutores e oportunidades, da 74ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)

O pano de fundo será o Plano Brasil Semicondutores, que se encaixa em uma série de medidas anunciadas em julho, há cinco meses do término do mandato de Bolsonaro, para tentar fortalecer a indústria nacional.

Na pressão para reverter extinção

Foto: Reprodução Youtube

Henrique Miguel fez uma apresentação, na 74ª Reunião Anual da SBPC, das metas do novo plano e como ele impactará a cadeia produtiva de semicondutores brasileira

Foto: Reprodução Youtube

Oliveira Miguel na realidade ratificou com mais detalhes a informação que deu no último dia 14 em uma audiência pública na Câmara dos Deputados. Na ocasião, se debateu a intenção de Paulo Guedes de implodir o Ceitec que, desde setembro do ano passado, tem o processo de extinção suspenso para análise do Tribunal de Contas da União (TCU).

Adão Villaverde, ex-secretário estadual de Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), foi uma voz ativa na audiência pública.

Um dos responsáveis pela implantação do Ceitec, Villaverde registra que existe uma grande pressão para a revisão da medida de Guedes. “Muitos clientes da Ceitec têm batido nas portas do MCTI cobrando”, diz.

Ele considera a extinção da estatal proposta por Guedes algo que foge totalmente da razoabilidade. “Só é explicado em uma lógica reprimarização da nossa economia, de se manter o Brasil com o foco na exportação de comodities e importação de produtos de alto valor agregado”, diz.

Papel estratégico do Ceitec

Foto: Reprodução Youtube

Villaverde, um dos responsáveis pela implantação do Ceitec: “Só é explicado em uma lógica reprimarização da nossa economia, de se manter o Brasil com o foco na exportação de comodities e importação de produtos de alto valor agregado”

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De acordo com o professor, a falta de semicondutores no mercado tem um grande impacto nas mais variadas cadeias produtivas mundiais. “Nos últimos tempos muitos fabricantes de smartphones, automóveis, aviões, entre outros suspenderam parte da produção por falta de componentes eletroeletrônicos”, lembra.

A Ceitec teria um papel estratégico, registra. Conforme seus dados, o mercado mundial que demanda esses componentes tem crescido exponencialmente: 10% em 2020, 20% em 2021. Até o final deste ano, a expectativa é de até 30% de crescimento.

Ao criticar a postura da equipe econômica, VillaVerde fala de um universo onde 70% das empresas que atuam no setor no Brasil realizam importações de insumos porque não realizam uma cadeia de produção completa.

“São menos de vinte empresas. Só a Ceitec e mais uma produzem praticamente tudo internamente”, fala.

Tempo de maturação

A alegação de Guedes de que o Ceitec consome recursos públicos sem apresentar resultados suficientes, é um argumento “tacanho” para Villaverde.

De acordo com o professor, toda empresa tem suas etapas de implantação. No caso de uma empresa de ponta, há o início e, depois, o que se chama de aceleração. O ápice é a maturidade. Isso tudo em um período de cerca de 10 anos, explica.

“A empresa iniciou em 2012, mas sua produção em patamares de alta escala, fabril, se deu por volta de 2017. Os 10 anos de maturação da empresa seria, então, lá por 2025, 2026”, declara Villaverde.

Hoje o mercado global que consome semicondutores depende fortemente do leste asiático que é responsável por atender 80% da demanda.

Para tentar reduzir essa dependência, os Estados Unidos têm feito uma série de políticas para subsidiar a sua indústria nacional. O contrário do que é proposto pela equipe econômica do governo Bolsonaro.

Há dois dias, manchetes no mundo registram que o Senado Norte-americano aprovou a destinação de U$ 280 bilhões para “aumentar a competitividade” do país com a China.

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