Nova CLT e revogação da Reforma Trabalhista já tramitam no Senado
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado
Na próxima sexta-feira, 19, o senador Paulo Paim estará em Porto Alegre para promover o debate na Assembleia Legislativa do RS (ALRS) sobre o Estatuto do Trabalho, também apelidado de Nova CLT. O Projeto de Lei tramita no Senado Federal e, na prática, pretende revogar a Reforma Trabalhista de 2017.
Com mais de 700 artigos, o texto regulamenta assuntos relacionados à inclusão social, autorregulação sindical, modernização do trabalho, salário mínimo mensal e jornada de trabalho de 40h semanais. Além disso, pretende garantir os direitos já consolidados pela CLT, além de atualizar a legislação trabalhista inserindo as novas formas de trabalho, tais como motoristas de aplicativo e entregadores de comida.
Estarão presentes na audiência pública além do senador Paim, deputados, representantes das centrais sindicais, sindicatos, a delegacia regional do Ministério do Trabalho, membros da Justiça do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho, OAB, entre outras autoridades e público em geral.
“Este projeto é muito importante, porque abre um guarda-chuva geral para reescrever a legislação trabalhista. Para o movimento Sindical, o que está ainda em discussão é se o caminho mais estratégico é uma escrita ampla que mexa com a Constituição num momento em que existe uma baixa correlação de forças no Congresso para esta matéria”, pondera Amarildo Cenci, presidente da CUT/RS, que estava em Brasília, para audiências no Ministério do Trabalho e confirmou presença na sexta à audiência.
Para ele, a configuração do parlamento hoje é desfavorável aos trabalhadores. Ainda assim, é importante construir, a partir deste debate da Reforma Trabalhista uma nova proposta de reestruturação da negociação coletiva, além de estabelecer leis que deixem clara a importância da força das estruturas sindicais organizadas e representativas, para que se garanta a sustentação financeira das entidades sindicais.
Segundo Cenci, o contrato coletivo, aquilo que foi acordado precisa ser cumprido por todas as partes, especialmente a dos empregadores, “que são contumazes descumpridores das mais elementares leis existentes no nosso país”.
“O debate é bem-vindo, mas entendo que neste momento temos de fazer uma revisão da reforma que foi feita e um legislação inclusiva dos trabalhadores de aplicativos e plataformas, ainda excluídos da legislação trabalhista e do sistema de seguridade social e previdenciária. É importante aprofundar este tema para convencer a sociedade de que é preciso modernizar a legislação trabalhista no sentido de inclusão dos trabalhadores da valorização do trabalho e não o contrário, como está posto desde a reforma”, conclui.
A audiência pública é uma iniciativa dos deputados Adão Pretto Filho (PT) e Miguel Rossetto (PT) através da Comissão de Defesa do Consumidor e do Contribuinte e Participação Legislativa Popular. O evento é aberto a toda a comunidade e será transmitido pelo Youtube TVALRS e redes sociais do senador Paim.
Contra a reforma (Nova CLT)
A SUG 12/2018, apelidada de “novo Estatuto do Trabalho”, e “nova CLT” por Paim, seu relator, regulamenta assuntos relativos à inclusão social no trabalho, autorregulação sindical, modernização trabalhista, salário mínimo mensal e jornada de 40 horas semanais.
A sugestão — termo para ideia legislativa que se origina da sociedade — possui as associações Sinait, ALJT, Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) como autores.
A apresentação do texto foi um dos objetivos da Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho (CDHET), criada na CDH em 2017 para reavaliar e propor alternativas à reforma trabalhista promovida pela Lei 13.467, de 2017. A reforma alterou regras relativas a remuneração, plano de carreira, jornada de trabalho, entre outros pontos.
A sugestão legislativa foi arquivada em dezembro de 2022 em virtude do encerramento da legislatura. Mas o requerimento de Paim, aprovado no Plenário em março, desarquivou o projeto, que continua tramitando na CDH.
Subnotificação de trabalho informal
Subnotificação do trabalho informal, prejuízos causados pela flexibilização de horários e casos de desrespeito aos direitos dos empregados domésticos foram pontos discutidos em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) na última segunda-feira, 15.
A reunião integrou um ciclo de debates proposto pelo presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), a fim de aprofundar a discussão sobre os efeitos da reforma trabalhista de 2017 e instruir a Sugestão (SUG) 12/2018, apresentada ao Senado por entidades de defesa dos direitos dos trabalhadores, que propõe a criação do Estatuto do Trabalho.
O tema da audiência foi O Estatuto do Trabalho e meio ambiente do trabalho: trabalho digno; plataformas; teletrabalho; normas regulamentadoras e responsabilidade civil.
“Defendo a CLT, e continuarei defendendo sempre. Quando falamos do Novo Estatuto do Trabalho, trata-se de uma atualização fruto de uma sugestão legislativa da qual tenho a honra de ser relator. É um debate do século 21, um passo à frente, e não um retrocesso. Em todos os eventos que realizamos e vamos realizar, sempre o aprimoramos”, asseverou Paim.
Meio ambiente do trabalho
Cirlene Luiza Zimmermann, procuradora do Ministério Público do Trabalho e substituta eventual da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, lembrou que o trabalho é como uma “segunda identidade”, e por isso não pode ser algo que “adoece, que causa dor e sofrimento”, mas precisa ser “digno, sustentável, seguro e saudável”.
“Em 2022, o direito ao meio ambiente de trabalho saudável e seguro foi considerado pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) como um princípio e direito fundamental. No mesmo ano, a Assembleia das Nações Unidas declarou o meio ambiente limpo, saudável e sustentável — e sempre que se fala em meio ambiente, inclui a perspectiva do trabalho, como um direito humano fundamental”, disse a procuradora.
Ela afirmou que o novo Estatuto do Trabalho ajudará na evolução nas relações trabalhistas, assegurando um ambiente saudável para os empregados. Ela salientou que as empresas que querem se manter no mundo dos negócios devem cumprir os requisitos mínimos em relação aos trabalhadores.
Cirlene Zimmermann disse que a jornada de trabalho está vinculada à segurança da atividade laboral. E manifestou preocupação com projetos de lei que tramitam no Congresso e condicionam o cumprimento das regras trabalhistas pelas empresas ao porte do empreendimento, por exemplo.
“Na realidade, o que traz o risco para uma empresa é a atividade em si, então precisamos desvincular questões que não têm vinculação alguma. É um cenário de preocupação que merece nosso registro”, declarou Cirlene Zimmermann, para quem é preciso fomentar uma cultura de prevenção de doenças e acidentes de trabalho, visto que a saúde é valor inalienável.
Preservação da saúde
Representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Ana Luiza Horcades apontou que a pandemia de covid-19 trouxe uma necessidade de revisão das formas de trabalho para os empregados, de maneira geral, a fim de que o Estatuto do Trabalho não nasça “já velho”.
A auditora do trabalho afirmou que a informalidade dificulta o dimensionamento das mortes ocorridas no desempenho da atividade laboral, por exemplo. E que essa ausência de dados, agravada após a epidemia de coronavírus, atrapalha a elaboração de políticas de prevenção de acidentes de trabalho e de preservação da saúde.
“Muita gente morreu na pandemia porque precisava trabalhar. Mas é um número que a gente não consegue de fato conhecer em função, principalmente, da informalidade. A gente tem um grupo enorme de pessoas que morreram, por exemplo, pela falta de trabalhadores em determinados serviços. Além disso, temos as pessoas que trabalham na área da saúde, cujos índices de contaminação foram altíssimos e, por isso, carregam sequelas. Então, para seguirmos nesse projeto de melhorar o nosso estatuto do trabalho, podemos incorporar questões macro, como esse gerenciamento dos riscos ocupacionais”, disse Ana Horcades.
Para o procurador do Trabalho e vice-coordenador nacional da Coordenadoria de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho, Renan Bernardi Kalil, a flexibilidade de horários adotada por empresas de entrega por aplicativos, por exemplo, gera prejuízos financeiros aos empregados. Segundo ele, apesar de parecer um benefício, essa modalidade gera riscos e acarreta mais carga de trabalho, principalmente para aqueles que dependem economicamente da atividade. O debatedor considerou a audiência pública da CDH fundamental para ajudar a sociedade a reconhecer, inclusive, as desigualdades econômicas verificadas entre empregadores e trabalhadores.
“Em geral, essas plataformas de empresas de entrega têm um sistema de remuneração que paga muito pouco, mas resultam numa margem de manobra que gera um grau de arbitrariedade muito grande para os trabalhadores”, disse.
Representante do Movimento da Advocacia Trabalhista Independente (Mati), Rosildo Bomfim observou que não se trata de uma “demonização da tecnologia”, mas é preciso fazer separação entre as empresas que usam as plataformas digitais como meio de negócios e aquelas que usam esses instrumentos apenas para tentar fraudar as leis trabalhistas. O advogado disse ser preciso evitar que o trabalhador seja transformado em uma “mercadoria” e pediu atenção dos congressistas quanto aos projetos de lei em tramitação sobre o assunto.
“Não fazemos reforma na nossa casa para piorá-la. Reformas são para melhorar, são para pegar, por exemplo, trabalhadores fora do sistema protetivo e colocá-los dentro” observou.
Contratos precários
A ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Delaíde Alves Miranda Arantes ressaltou que os juízes trabalhistas têm o dever de controlar as normas e verificar se essas regras estão seguindo as diretrizes internacionais.
Ela disse que a proteção ao trabalhador é a razão de ser da CLT e defendeu uma atuação conjunta do Legislativo, do Executivo e do Judiciário para fortalecer os trabalhadores. Ela citou a atualização da legislação trabalhista em países como Portugal, que estão punindo com prisão empregadores domésticos que não cumprem seus deveres.
“Está em vigor desde 1º de maio, dentre outras medidas, pena de prisão para o empregador doméstico que não fizer o registro desse profissional. É um processo criminal. Enquanto isso, a reforma trabalhista no Brasil contribuiu para a exploração do trabalho infantil, para o trabalho escravo, para a terceirização ampla com contratos precários, onde tudo contribuiu enormemente para a piora dos indicadores. Está sendo muito violado o trabalho digno previsto na nossa Constituição”, alertou.
Violação de direitos
O diretor do Departamento de Segurança e Saúde do Trabalhador do Ministério do Trabalho e Emprego, Henrique Mandagará de Souza, destacou os índices de trabalho análogo à escravidão verificados especialmente em áreas rurais e a cultura do trabalho escravo doméstico que ainda persiste. O representante do governo observou que essa violação de direitos se mostra maior em relação às mulheres. E destacou que a pasta é parceira da CDH.
“A gente continua afastando crianças e adolescentes de trabalhos proibidos […]. Precisamos pensar, por exemplo, formas de fortalecer as representações [sindicais] dos trabalhadores. São desafios complexos, já que as novas formas de trabalho dificultam a própria organização dos trabalhadores, seja na terceirização irrestrita, seja no crowdworking (modalidade onde pessoas são contratadas via plataforma digital e executam tarefas online para empresas ou outros indivíduos)”, explicou o diretor.
Também participaram do debate o presidente da Associação Latino-americana de Juízes do Trabalho (ALJT), Hugo Cavalcanti Melo Filho, e o representante do Núcleo de Pesquisa e Extensão “O Trabalho Além do Direito do Trabalho” (NTADT) e do Grupo de Pesquisa “Meio Ambiente do Trabalho” (GPMAT), ambos vinculados ao Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), professor Guilherme Guimarães Feliciano.