TSE pode tornar Bolsonaro inelegível na próxima quinta
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Terminou às 12h40 desta quinta-feira, 22 junho, no Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o primeiro dia do julgamento da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) 0600814-85, analisa ação contra Jair Bolsonaro e Walter Braga Netto por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação e que poderá tornar o ex-presidente inelegível.
A retomada do processo será na próxima terça-feira, 27, a partir das 19 horas, e poderá ser acompanhada ao vivo pelo canal do TSE. A Corte reservou três sessões ordinárias para a análise do processo. Ou seja, além da sessão desta quinta, o julgamento prosseguirá nos dias 27 e 29.
Até o momento, o corregedor leu o relatório, o representante do Partido Democrático Trabalhista (PDT) apresentou os argumentos da acusação, e o advogado fez a defesa dos acusados.
Na terça, o julgamento será retomado com o voto do relator. Em seguida, votam os ministros Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, a vice-presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, o ministro Nunes Marques e, por último, o presidente do Tribunal, ministro Alexandre de Moraes.
A ação que pode torna ex-presidente inelegível
Inicialmente, o corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, apresentou o relatório da Ação. A leitura do documento deu início ao julgamento do processo, e o corregedor ressaltou que, embora o teor do relatório seja público desde o dia 1° de junho, a apresentação durante a sessão permite amplo conhecimento do trâmite do processo a todas e todos que acompanham a sessão.
A ação foi ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), que aponta irregularidades durante a reunião realizada por Bolsonaro com embaixadores, em julho de 2022, quando o então presidente fez ataques ao sistema eleitoral brasileiro, a fim de favorecer sua candidatura à reeleição.
Ao longo do relatório, o ministro detalhou as alegações apresentadas pelas partes, bem como o parecer da Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE). Narrou que o PDT alega que Bolsonaro usou a estrutura da Presidência da República para apresentar informações falsas e desacreditar as urnas. Em contrapartida, segundo informou o ministro, a defesa sustenta que o encontro com os embaixadores funcionou como um intercâmbio de ideias sem qualquer cunho eleitoral.
Conforme o relatório, o MP Eleitoral opina pela parcial procedência da ação, para que seja declarada a inelegibilidade somente de Jair Messias Bolsonaro em razão de abuso de poder político e de uso indevido dos meios de comunicação, e pela “absolvição do candidato a vice-presidente, a quem não se aponta participação no caso”.
MP Eleitoral defende apenas Bolsonaro inelegível e exclui Braga Netto
O vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, apresentou o parecer do MP Eleitoral, que defende a parcial procedência da ação, e para que seja declarada a inelegibilidade somente de Bolsonaro e pela absolvição do candidato a vice-presidente, “a quem não se aponta participação no caso”. O parecer ocorreu logo após acusação e defesa apresentarem os respectivos argumentos.
Na ação, a legenda aponta a ocorrência de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação na reunião realizada por Bolsonaro com embaixadores, em julho de 2022, quando o então presidente fez ataques ao sistema eleitoral brasileiro, a fim de favorecer sua candidatura à reeleição naquele ano.
Durante a leitura do parecer, Gonet Branco apontou que o êxito da ação depende da junção de quatro elementos que, para o MP Eleitoral, estão evidentes nos autos:
“Primeiro, a condição de agente público do sujeito da conduta. Segundo, desvio de finalidade de situação vinculada ao cargo em que o sujeito está investido. Terceiro, a busca de vantagem para situação eleitoral do candidato. E quarto, a gravidade da conduta para afetar a legitimidade do processo eleitoral”, destacou.
Gonet Branco afirmou que todos os fatos descritos e apurados dizem respeito a condutas apenas do então presidente Bolsonaro e que não se atribui ao candidato a vice-presidente nenhuma participação nos eventos que motivaram a investigação. “Como não há mandato a cassar, adianto que o Ministério Público se manifesta pela improcedência da ação de investigação contra Walter Braga Netto”, afirmou.
O vice-procurador-geral eleitoral relembrou que, no evento em questão, altos representantes diplomáticos estrangeiros e autoridades brasileiras ouviram comunicações sobre a falta de confiabilidade do sistema eletrônico de votação e apuração adotado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “O presidente alertou que, sob esse sistema, se estava na iminência de se realizarem eleições viciadas e ilegítimas, maliciosamente dirigidas para beneficiar o seu principal adversário.
O discurso ganhou difusão nacional por meio de sistema de televisão público federal e de reprodução em redes sociais do investigado”, acrescentou. Para o MP Eleitoral, tal discurso se dirigiu ao conjunto de eleitores brasileiros, e não apenas aos representantes diplomáticos presentes.
Desconfiança
Ainda segundo o parecer, diante das circunstâncias, não há como acolher o argumento de que o então presidente da República estaria apenas exercendo direito de liberdade de expressão, movido pelo propósito de debater melhorias no sistema eleitoral. As informações levadas aos cidadãos pela retransmissão da reunião, segundo ele, “não contribui para o progresso das estruturas da democracia, mas a degrada ardilosamente pela destruição da confiança de que o sistema depende”.
Conforme destacou Gonet Branco, está caracterizado que o candidato à reeleição se valeu da sua situação funcional de presidente da República para, mediante notícias que sabia ou deveria saber que não são verdadeiras, obter a atenção e a adesão de eleitores. “Está caracterizado o uso da função pública para benefício eleitoral indevido”, disse.
Sobre esse ponto, ele ressaltou que a avaliação tem o abono do Supremo Tribunal Federal (STF) na Tutela Provisória Antecedente 39 (TPA).
“A gravidade de ataque infundado ao sistema de votação foi realçada no voto do ministro Gilmar Mendes quando ele disse que o discurso de ataque sistemático a confiabilidade das urnas eletrônicas não pode ser reenquadrado como tolerável em um estado democrático de direito, no qual se propugna o sufrágio universal pelo voto direto e secreto como um direito fundamental qualificado como cláusula pétrea, especialmente por um pretendente a cargo político”, ressaltou.
O vice-procurador-geral eleitoral enfatizou no parecer que bastaria essa perspectiva para que a gravidade do evento fosse conhecida. Mas que, esse elemento, contudo, ganha marcada dimensão quando se levam em conta acontecimentos posteriores à reunião. “Circunstâncias que o Tribunal entendeu que compõem o âmbito de cognoscibilidade desta Aije”, citando que o juiz pode e deve levar em consideração fatos supervenientes ao ajuizamento da ação que interfiram no julgamento do mérito, conforme consta no artigo 493 do Código de Processo Civil.
Atos de 8 de janeiro
Gonet Branco ressaltou que o chamado à desconfiança das eleições não rendeu ao candidato a maioria de votos, mas provocou reações de descomedida desconfiança de parcela da população sobre a legitimidade dos resultados das urnas como jamais se viu desde o advento da Constituição de 1988. “Igualmente sob esse segundo ângulo, se exibe a gravidade da circunstância: o quarto elemento caracterizador do abuso poder político”, disse.
Na avaliação do MP Eleitoral, portanto, estão reunidos todos os elementos definidores do abuso de poder político de que o candidato investigado é acusado. “A conclusão do parecer se conforta em precedente do TSE de 2021, no caso Francischini, em que se definiu que ataques ao sistema eletrônico de votação podem configurar abuso de poder político e ou em uso indevido dos meios de comunicação quando redes sociais são usadas para esse fim”, afirmou.
Para o MP Eleitoral, o precedente ressalta a outra hipótese de procedência da ação referente ao uso indevido dos meios de comunicação. “O pedido de condenação do primeiro investigado à pena que ainda resta cabível, de inelegibilidade, merece acolhida”, concluiu.
Acusação versus defesa
O Partido Democrático Trabalhista (PDT), autor da Ação, e a defesa de Jair Bolsonaro e Braga Netto, candidatos à Presidência da República em 2022, defenderam os respectivos argumentos perante a corte. As sustentações orais foram apresentadas após a leitura do relatório da Aije pelo corregedor-geral eleitoral, ministro Benedito Gonçalves.
Ao defender da tribuna a procedência da Aije e que Jair Bolsonaro fique inelegível, assim como Braga Netto, o advogado do PDT, Walber Agra, destacou que a ação não trata apenas de uma reunião, com evidente desvio de finalidade, de um presidente da República com embaixadores estrangeiros, no Palácio da Alvorada, no dia 18 de julho de 2022. “Trata-se de uma Aije contra ataques sistemáticos ao sistema eleitoral, em defesa das instituições e da democracia”, afirmou o representante do partido.
Segundo o advogado, não se trata somente de investigar o que foi dito pelo então presidente na reunião com diplomatas, mas apurar uma pluralidade de fatos passados (Eleições 2018) e recentes (Eleições 2022), na qual Jair Bolsonaro pôs em cheque a legitimidade do sistema eleitoral, com alegações de supostas fraudes, sem prova alguma apresentada.
“Na Aije, rogou-se que o Judiciário pudesse investigar as tipificações de abuso de poder político, de conduta vedada, de desordem informacional e de uso indevido de meios de comunicação”, ressaltou o advogado, dizendo que todas elas foram confirmadas por provas robustas no processo.
O representante do PDT afirmou, ainda, que a inclusão da minuta do decreto de estado de defesa no processo é uma consequência dos desdobramentos dos fatos. “Não se configura uma nova causa de pedir, porque o nexo causal é o mesmo”, pontuou Walber Agra.
Defesa alega desvirtuamento de finalidade
Já a defesa de Jair Bolsonaro e Braga Netto, feita pelo advogado Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, questionou desde o início da interposição da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije), que a classificou como “flagrante desvirtuamento de finalidade, impostora e repleta de falsidade ideológica”. Considerou ilegal a inclusão de documento apócrifo de minuta de decreto de estado de defesa e o argumento de suposta tentativa de golpe no ato de 8 de janeiro, diante da falta de conexão entre os fatos.
O advogado reiterou que o então presidente da República estaria, na ocasião da reunião com os embaixadores, resguardado pela liberdade de expressão e que “a exposição de pontos de dúvidas à comunidade internacional, em evento público constante de agenda oficial de Chefe de Estado soberano, foi no afã de aprimorar o processo de fiscalização e transparência do processo eleitoral”.
Ele também reafirmou que Bolsonaro abordou, de forma legítima, o debate com embaixadores sobre a confiabilidade do sistema eleitoral e que suas manifestações respeitaram os limites da liberdade de convicção pessoal. Segundo a defesa, não existem “provas contundentes do prejuízo ao processo eleitoral”, mas apenas “considerações vagas e imprecisas acerca da eventual gravidade do discurso apresentado aos embaixadores”.
Em conclusão, a defesa sustentou que não houve qualquer hostilidade antidemocrática ao sistema eleitoral no evento que classificou como “típico ato de governo”, em que não se tratou sobre eleições e não houve pedido de votos, comparação entre candidaturas ou ataques a oponentes, “ato que não pode ser enquadrado como abuso do poder político ou uso indevido dos meios de comunicação”.
Defesa terá mais tempo
Na véspera do julgamento, o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, recebeu, em audiência, o advogado do ex-presidente da República Jair Bolsonaro e de Braga Netto, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto.
Na ocasião, Moraes comunicou ao advogado que, em respeito ao amplo direito de defesa e ao devido processo legal, a defesa poderia, durante a sustentação oral, utilizar e citar todos os documentos e depoimentos, bem como todas as peças e perícias, além de quaisquer outras provas existentes nos autos da Aije.
O advogado também foi informado que o prazo para sustentação oral seria prorrogado de 15 para 30 minutos, atendendo ao pedido realizado por ele. O tempo foi somado em virtude da junção das defesas de Bolsonaro e de Braga Netto.
Confira o passo a passo do julgamento no Plenário:
1) O corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, deverá iniciar o julgamento com a leitura do relatório da Aije. O relatório contém o resumo da tramitação da ação na Corte, informando as diligências solicitadas, os depoimentos tomados, bem como as perícias e as providências requeridas pelo relator na etapa de instrução processual.
2) Logo após a leitura, o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, concederá a palavra, da tribuna, aos advogados de acusação e aos de defesa das partes envolvidas na ação, nessa ordem.
O inciso I do artigo 16 da Resolução TSE nº 23.478, de maio de 2016, estabelece que o prazo para as partes fazerem sustentação oral é de 15 minutos nos processos originais. No caso, uma Aije referente à eleição presidencial é um feito originário de julgamento do próprio TSE.
3) Em seguida, será dada pelo presidente a palavra ao representante do Ministério Público Eleitoral (MP Eleitoral) para que emita o parecer do órgão sobre a ação.
4) Finalizadas essas etapas, o ministro Benedito Gonçalves apresentará o seu voto na ação.
5) Na sequência, votam os ministros Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, a vice-presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, o ministro Nunes Marques e, por último, o presidente do Tribunal, ministro Alexandre de Moraes.
Segundo o artigo 18 do Regimento Interno do TSE, o ministro que solicitar vista do processo deverá devolver os autos para retomada do julgamento no prazo de 30 dias, renováveis por mais 30, contado da data da sessão em que o pedido de vista foi formulado.
Assista em tempo real o julgamento que pode torna Bolsonaro inelegível e veja como foi o primeiro dia: