Golpe: é preciso punir quem ameaça a democracia, cobra Instituto Herzog
Arte sobre fotos de Alan Santos/PR; reprodução de Pinochet de Silvaldo Leung Vieira (1975)
Arte sobre fotos de Alan Santos/PR; reprodução de Pinochet de Silvaldo Leung Vieira (1975)
A divulgação de trecho da deleção premiada do tenente-coronel Mauro Cid que registra reunião do então presidente da República Jair Bolsonaro (PL) para pressionar comandantes das Forças Armadas por um golpe é oportunidade de adotar medidas para responsabilizar militares por ações contra a democracia. Esse é o resumo de nota emitida pelo Instituto Vladimir Herzog quinta-feira, 21.
O documento foi lançado no mesmo dia em que congressistas americanos pediram ao governo dos Estados Unidos um pedido de desculpas por sua participação no golpe de Estado de Augusto Pinochet (que teve ativa participação de militares brasileiros e da CIA) e é um alerta de que a democracia brasileira permanece sob ameaça.
Para a entidade, os atos antidemocráticos realizados em Brasília no dia 8 de janeiro são resultados da falta de condenação de “agentes que há muito e livremente” atentaram contra o Estado democrático de Direito no país.
A coincidência de datas tanto da vinda à tona do relato do ex-ajudante de ordens quanto dos manifestos do Instituto e dos parlamentares em Washington e a condenação recente de agentes da ditadura chilena, no entanto apontam para um mundo que hostiliza atentados contra a democracia.
No Chile, cadeia apesar de idade avançada
Em junho passado o general Santiago Sinclair, apesar da idade avançada de 92 anos, teve confirmada a sua condenação de 18 anos de prisão em 2020 por ter participado em uma Caravana da Morte que matou 12 camponeses.
Aliado de Pinochet, ele chegou a integrar a junta militar que comandou o Chile e chegou a ser nomeado como senador vitalício no final do regime.
Acompanharam Sinclair ao cárcere, os também idosos agentes da ditadura Emilio de la Mahotiere e Juan Chiminelli, de 86 anos, e Pedro Espinoza, 90.
A Caravana da Morte foi o movimento de violação dos direitos humanos que percorreu o Chile na busca de opositores para execução após a derrubada de Salvador Allende.
Os números oficiais da tomada do poder pelos militares de Pinochet que sempre foi elogiado por Bolsonaro foram mais de três mil mortos e 38 mil pessoas torturadas.
Estímulo ao golpe
Na resolução dos congressistas americanos, há ainda um pedido para que a Casa Branca torne público mais documentação sobre o envolvimento e estímulos dos Estados Unidos ao movimento de Pinochet.
Segundo ela, há um “profundo pesar pela contribuição dos Estados Unidos na desestabilização das instituições políticas do Chile e do processo constitucional”.
O pedido de desculpas dos parlamentares americanos se dá após o Brasil ter pedido perdão aos chilenos pela contribuição dada pelo governo militar chefiado pelo general Emílio Garrastazu Médici.
Foi no dia 11 de setembro, marco da derrubada e morte de Allende. Na ocasião, representando o Brasil, o ministro da Justiça e da Segurança Pública Flávio Dino (PSB) disse: “é para mim muito doloroso, mas necessário dizer que eu acuso e odeio a ditadura brasileira. Estamos aqui a fazer uma reparação histórica internacional. Estamos aqui também a pedir desculpas ao povo chileno porque a vil ditadura brasileira contribuiu para que houvesse o golpe militar no Chile há 50 anos”.
Veja a nota do Instituto Vladimir Herzog em sua íntegra
“O trecho da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid que relata reunião do ex-presidente Jair Bolsonaro com oficiais das Forças Armadas para discutir o planejamento de um golpe de Estado no país após o resultado das eleições de 2022 é um indício evidente de que a democracia brasileira, conquistada duramente após 21 anos de regime ditatorial, permanece ameaçada.
Fatos como os revelados agora pelo ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e episódios como os ataques de 8 de janeiro de 2023 são resultados diretos da ausência de políticas efetivas para a responsabilização e punição de agentes que há muito e livremente praticam crimes contra o Estado democrático de Direito.
Os graves acontecimentos revelados por Mauro Cid nos colocam novamente diante da oportunidade de responsabilizar todos os que atentaram contra a nossa democracia. Os trabalhos da CPMI dos Atos Antidemocráticos e as ações julgadas no Supremo Tribunal Federal são fundamentais para a efetiva superação da cultura de impunidade que marca a história do País.
Conclamamos a sociedade civil para que se mobilize amplamente em defesa da democracia e reivindique medidas firmes contra os atos e intentos golpistas e seus responsáveis. Para que o passado não mais nos assombre e a memória nos sirva de lição para a defesa da democracia e a construção de um futuro de justiça.”