POLÍTICA

Cresce pressão para Brasil romper relações diplomáticas com Israel

Carta a Lula assinada por personalidades pede que o Brasil radicalize sua postura em relação ao líder sionista Netanyahu cada vez mais isolado
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 31 de maio de 2024
Cresce pressão para Brasil romper relações diplomáticas com Israel

Foto: Ricardo Stuckert / PR/ Arquivo

Lula com o primeiro-ministro da Autoridade Palestina, Mohammad Shtayyeh, na Sede da União Africana, em Adis Abeba, na Etiópia, em fevereiro deste ano. “O Brasil condenou o Hamas, mas o Brasil não pode deixar de condenar o que o Exército de Israel está fazendo na Faixa de Gaza”, disse o presidente brasileiro à época

Foto: Ricardo Stuckert / PR/ Arquivo

Chegou às mãos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) uma curta mas incisiva mensagem de professores, intelectuais, juristas e integrantes da classe artística que querem uma postura mais radical do Brasil em relação ao massacre de palestinos pelo Exército de Israel, na Faixa de Gaza. Diante da ofensiva militar que já ultrapassou 30 mil mortos na Palestina, o Brasil deve romper imediatamente relações diplomáticas com Israel, reivindicam os signatários.

Redigido em forma de carta (leia a íntegra no final desta matéria), o documento conta com a assinatura de personalidades como os cantores e compositores Chico Buarque, Gilberto Gil e Emicida, os juristas Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay; Carol Proner, Kenarik Boujikian, Pedro Serrano e o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, entre outros.

Os atores Wagner Moura e José Abreu também registraram seus nomes ao lado de escritores e intelectuais como Jessé Souza e Milton Hatoum.

Outra assinatura de destaque é do professor emérito da Fundação Getúlio Vargas, o economista e ex-ministro da Fazenda e de Ciência e Tecnologia, Luiz Carlos Bresser Pereira.

A mensagem também é endossada por judeus como o jornalista Breno Altman e os professores Anita Leocádia Prestes, Bruno Huberman. Anita é filha do líder político Luís Carlos Prestes e Olga Benário, guerrilheira judia entregue a Hitler pelo governo Vargas e assassinada em um campo de extermínio nazista.

Carnificina insuportável

A carta a Lula diz que, apesar das seguidas propostas de cessar-fogo apresentadas pelo Brasil, “a crescente violência imposta pelo governo Netanyahu, com ataques desumanos e cruéis contra civis, obriga o mundo a ir além de gestos e propostas diplomáticas, como já debatem diversos países da União Europeia e outras regiões”.

Classificando a situação como “carnificina insuportável” promovida pelo estado de Israel, a mensagem lembra os recentes ataques a um acampamento de refugiados em Rafah, no sul de Gaza.

Frisa o documento, “com dezenas de inocentes assassinados”, fica demonstrado de forma clara um “inaceitável desprezo à ética humanitária”.

Para os signatários é hora de o Brasil se juntar a nações que já romperam relações diplomáticas e comerciais com o Estado de Israel, “exigindo o cumprimento das decisões que ponham um fim ao genocídio e garantam a autodeterminação do povo palestino”.

Até o momento, Bolívia, Bahrein, Turquia, Belize e África do Sul são as nações que romperam seus laços com Israel por considerar as ações de Israel em Gaza como desproporcionais e criminosas.

Cerco se fechando

No dia 20 de maio, o procurador-chefe do Tribunal Penal Internacional (TPI) pediu a prisão do primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e de seu ministro da defesa, Yoav Gallant, por crimes de guerra. Três líderes do Hamas também tiveram seus nomes incluídos na denúncia.

Apesar disto e da Corte Internacional de Justiça (CIJ) ter ordenado a suspensão das operações militares enquanto acontecem esforços diplomáticos para um cessar-fogo, Israel permanece bombardeando e avançando sobre o povo palestino.

A TPI e a CIJ são cortes judiciais da Organização das Nações Unidas (ONU), sediadas em Genebra.

Nos últimos dias, além dos países que romperam suas relações diplomáticas com Israel, Netanyahu tem visto o número de países contrários à sua política tomar ações para deixar claro sua insatisfação.

No dia 28, Espanha, Noruega e Irlanda anunciaram o reconhecimento à Palestina como Estado.

Apesar de ter criticado duramente e convocado seus embaixadores, Netanyahu viu o premiê irlandês já anunciar a criação da embaixada do seu país em Ramal, na Cisjordânia, e a designação de um embaixador.

O Brasil não rompeu relações diplomáticas com Israel, mas, diante do que considerou uma humilhação ao seu embaixador no país, ao ser chamado para uma reprimenda pública no Museu do Holocausto por causa de declarações do presidente Lula, na prática, rebaixou suas relações.

Hoje Israel não conta com um embaixador brasileiro em seu solo, mas um encarregado de negócios.

Leia a íntegra da carta enviada a Lula

Carta aberta ao presidente Lula sobre o genocídio do povo palestino

Estimado presidente Lula,

Antes de mais nada, queremos saudá-lo por seu comportamento sempre firme e coerente em solidariedade ao povo palestino, denunciando reiteradamente o genocídio do qual é vítima, especialmente suas mulheres e crianças.

O Brasil tem apresentado seguidas propostas para o cessar fogo na Faixa de Gaza e a solução de dois Estados estabelecida por resoluções internacionais.

Graças ao seu governo, somos uma das nações que reconhecem, no âmbito das Nações Unidas, a soberania e a independência da Palestina.

No entanto, a crescente violência imposta pelo governo Netanyahu, com ataques desumanos e cruéis contra civis, obriga o mundo a ir além de gestos e propostas diplomáticas, como já debatem diversos países da União Europeia e outras regiões.

O governo Netanyahu viola abertamente deliberações emanadas da Corte Internacional de Justiça, colocando-se à margem do direito, além de desrespeitar o Conselho de Segurança e a Assembleia Geral da ONU. 

Recentes ataques contra um acampamento de deslocados em Rafah, no sul de Gaza, com dezenas de inocentes assassinados, demonstram claramente inaceitável desprezo à ética humanitária.

Estamos convencidos, querido presidente, que é hora de nosso país se juntar às demais nações que romperam relações diplomáticas e comerciais com o Estado de Israel, exigindo o cumprimento das decisões que colocam fim ao genocídio e garantem a autodeterminação do povo palestino.

Essas medidas, adotadas por nosso país e sob uma liderança de sua envergadura, certamente serviriam de exemplo a outros governos e constituiriam uma imensa contribuição para que se encerre essa carnificina insuportável.

Quem assina:

Amanda Harumy, Anita Leocadia Prestes, Antônio Carlos de Almeida Castro, Arlene Clemesha, Berenice Bento, Breno Altman, Bruno Huberman, Carol Proner, Cézar Brito, Chico Buarque, Eleonora Menicucci de Oliveira, Emicida, Eugênio Aragão, Francirosy Campos Barbosa, Gilberto Gil, Heloísa Vilela, Jamal Suleiman, Jessé Souza, João Pedro Stédile, Jones Manoel, José de Abreu, José Dirceu, José Genoíno, Juliana Neuenschwander, Juarez Tavares, Kenarik Boujikian, Larissa Ramina, Luiz Carlos Bresser Pereira, Luiz Carlos da Rocha, Manoel Caetano Ferreira Filho, Manuella Mirella, Margarida Lacombe, Marly Vianna, Milton Hatoum, Nathalia Urban, Ney Strozake, Paulo Borba Casella, Paulo Nogueira Batista Jr., Paulo Sérgio Pinheiro, Paulo Vannuchi, Pedro Serrano, Reginaldo Nasser, Salem Nasser, Ualid Rabah

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