Câmara pede que STF revise suspensão de emendas parlamentares
Foto: Lula Marques/ Agência Brasil
Em recurso apresentado ao ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), na manhã desta sexta-feira, 27, a Câmara dos Deputados pediu revisão da decisão que mandou suspender o pagamento de cerca de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão.
A petição, de 22 páginas, é assinada pelo advogado Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva, que representa a Câmara. No documento, ele rebate a ação proposta pelos partidos PSol e Novo e pelas entidades Associação Contas Abertas, Transparência Brasil e Transparência Internacional.
Entre outras questões, os partidos e entidades haviam alegado que a indicação de mais de 5,4 mil emendas teria ocorrido sem a aprovação das comissões e no período em que as reuniões dos colegiados haviam sido suspensas pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), entre os dias 12 e 20 de dezembro.
“Com a devida vênia, a argumentação dos peticionantes não corresponde à verdade e revela profundo desconhecimento do processo legislativo orçamentário. Essas informações imprecisas e descontextualizadas impedem a correta apreciação e valoração dos fatos”, argumenta a petição.
No recurso, a defesa da Câmara sustenta que as emendas foram aprovadas pelas comissões ao longo do ciclo legislativo e que o documento nº 1064, que listaria “5.449 emendas”, se refere à indicação dos projetos destinatários.
“A aprovação das emendas pelas comissões se dá a partir de sugestões feitas por parlamentares e aprovadas formalmente pelos colegiados. Após a aprovação e sanção, ocorrem as indicações ao Poder Executivo que, de acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias para o exercício de 2024, não têm caráter vinculante”, alega a defesa da Casa Legislativa. Na petição, o advogado também cita exemplos e informa o link onde estão registradas as atas de deliberação sobre as emendas.
Sobre a suspensão das atividades das comissões entre 12 e 20 de dezembro, a defesa da Câmara negou que seria uma estratégia para impedir a deliberação dos colegiados, como alegam os autores da ação. Essa suspensão se deu para possibilitar esforço concentrado às proposições de controle de gastos do Poder Executivo, que seriam votadas pelo plenário da Câmara dos Deputados.
Dino fixa prazo para Câmara esclarecer pagamento de emendas
O ministro STF deu prazo até às 20h desta sexta-feira, 27, para a Câmara dos Deputados responder a quatro questionamentos sobre o pagamento de emendas parlamentares. O prazo foi dado por Flavio Dino horas depois que a Câmara pediu a reconsideração da liminar dele que suspendeu o pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão.
No entendimento do ministro, a Câmara ainda não cumpriu as decisões de Corte que determinaram regras de transparência e rastreabilidade no repasse das emendas. “Assim, caso a Câmara dos Deputados deseje manter ou viabilizar os empenhos das emendas de comissão relativas ao corrente ano, deverá responder objetivamente aos questionamentos acima indicados até as 20h de hoje (27 de dezembro), bem como juntar as atas comprobatórias da aprovação das indicações (ou especificações) das referidas emendas, caso existam”, decidiu o ministro.
Na decisão, Flávio Dino fez quatro perguntas que deverão ser respondidas pela Casa:
1 – Quando houve a aprovação das especificações ou indicações das emendas de comissão (RP 8) constantes do Ofício nº. 1.4335.458/2024? Todas as 5.449 especificações ou indicações das “emendas de comissão” constantes do ofício foram aprovadas pelas comissões? Existem especificações ou indicações de emendas de comissão que não foram aprovadas pelas comissões? Se não foram aprovadas pelas comissões, quem as aprovou?
2 – O que consta na tabela de especificações ou indicações de emendas de comissão (RP 8) como nova indicação foi formulada por quem? Foi aprovada por qual instância? Os senhores líderes? O presidente da comissão? A comissão?
3. Qual preceito da Resolução nº. 001/2006, do Congresso Nacional, embasa o referido Ofício nº 1.4335.458/2024? Como o Ofício nº. 1.4335.458/2024 se compatibiliza com os artigos 43 e 44 da referida Resolução?
4. Há outro ato normativo que legitima o citado Ofício nº. 1.4335.458/2024? Se existir, qual, em qual artigo e quando publicado?
Lira deixa a Câmara sob desgaste
Foto: Lula Marques/ Agência Brasil
Na noite de quinta-feira, 26, em declaração à imprensa, o presidente da Câmara dos Deputados defendeu que a liberação das emendas parlamentares têm obedecido critérios estabelecidos pelo Judiciário e os acordos firmados entre Executivo e Legislativo.
“Todos os atos foram feitos dentro dos acordos entre Executivo e Legislativo e nas conversas com o Poder Judiciário, obedecendo os trâmites legais internos”, reclamou Lira, que deixa a presidência da Câmara em fevereiro. Concorrem ao cargo o líder do Republicanos, Hugo Mota (PB), e o pastor Henrique Vieira (PSol-RJ).
O mandato do deputado alagoano à frente da Câmara se encerrou no dia 20 de dezembro marcado pelo desgaste, omissões, traições e jogos de poder que impediram avanços após os quatro anos de retrocesso sob Bolsonaro. E da imposição de pautas antidemocráticas, a exemplo do projeto que equipara o aborto ao crime de homicídio, defendido com unhas e dentes por Lira e aliados e que acabou saindo da pauta para dar lugar à pauta da reforma tributária.
Mandante do assassinato de Marielle
No entanto, na sua pior atuação como presidente do Legislativo, Lira fez de tudo para não pautar a cassação do deputado João Francisco Inácio Brazão, o Chiquinho Brazão (sem partido), apontado pela Polícia Federal por suas ligações com a milícia do Rio e indiciado como um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSol-RJ) e do motorista da parlamentar, Anderson Gomes.
Brazão foi cassado pelo Conselho de Ética da Câmara em agosto, recorreu à Comissão de Constituição e Justiça e teve o recurso negado. A decisão foi enviada ao plenário pela CCJ, mas o presidente da Câmara “fez cara de paisagem”, como afirma a bancada governista, e deixou expirar o prazo de 90 dias fixado pelo regimento para análise do plenário.
O ministro das Relações Exteriores, Alexandre Padilha, acusou Lira de tentar interferir para impedir a manutenção da prisão do parlamentar e empresário envolvido na execução da vereadora em março de 2018.
Entenda a suspensão das emendas
A suspensão no pagamento de emendas parlamentares teve origem em uma decisão do STF, de dezembro de 2022, que entendeu serem inconstitucionais alguns repasses que não estariam de acordo com as regras de distribuição de recursos.
Diante da situação, o Congresso Nacional aprovou uma resolução alterando essas regras. O PSol, então, entrou com uma ação contrária ao pagamento dessas emendas.
Em agosto deste ano, Dino, além de suspender o pagamento de emendas, determinou que a Controladoria-Geral da União (CGU) auditasse os repasses dos parlamentares por meio das emendas do chamado orçamento secreto. No dia 10 de dezembro, o governo federal publicou uma portaria conjunta para operacionalizar a liberação das emendas, dias antes da votação de uma série de medidas econômicas, incluindo pacote fiscal e a regulamentação da reforma tributária.
A portaria buscava concretizar a decisão do STF de estabelecer critérios de transparência e, com isso, permitir a efetivação do empenho e pagamento dos recursos indicados por parlamentares, bancadas e comissões.