SAÚDE

A cronobiologia em busca do tempo perdido

Jimi Joe / Publicado em 3 de junho de 2001

Muitas das coisas supostamente inexplicáveis que você sente no dia-a-dia, como um inconveniente ataque de preguiça no começo da tarde, quando você deveria estar trabalhando a pleno vapor, ou uma disposição pouco habitual para o sexo no meio da manhã, não significam que seu corpo seja um caso à parte. Esses comportamentos são exatamente os comportamentos biológicos padrões para o ser humano, independente de cor, credo político/religioso ou região geográfica em que viva. A cronobiologia, surgida no século XVIII, mas só incrementada no século XX, é assunto para cientistas de todo o mundo, incluindo, no Brasil, o Grupo Multidisciplinar de Desenvolvimento e Ritmos Biológicos, da USP, e o médico francês Yvan Touitou.

A cronobiologia procura oferecer melhoria na qualidade de vida e é tema de congressos internacionais nos quais são debatidos os resultados dos mais recentes tratamentos para diferentes perturbações dos ritmos biológicos. O avanço dos estudos nesse sentido tem mostrado que problemas oriundos de horários de trabalho não apropriados e situações de stress têm sido responsáveis pela deflagração de diversos processos de deterioração do corpo que podem chegar a formas avançadas de câncer ou de depressão profunda.

Touitou utiliza a exposição à luz com pacientes portadores de depressão sazonal. O pesquisador francês salienta que este tipo de depressão pode ser curado pelo tratamento que tem se mostrado eficaz em 80% dos casos. “A luz é um regulador fundamental da produção de melatonina que atua por via retino-hipotálmica. Este hormônio é considerado um tradutor do sinal luminoso ao organismo, sinalizando dias curtos e dias longos”, diz. Segundo ele, a melatonina é a “doadora do tempo” que permite vivermos em harmonia com o meio-ambiente.

As pesquisas de Touitou na área da cronobiologia apontam indicações sobre padrões comportamentais (veja quadro). O tratamento pela luz também pode ser aplicado a pessoas não inseridas num quadro de depressão, mas que enfrentam um descompasso entre relógio biológico e relógio astronômico, como viajantes que têm perturbações pelas alterações radicais de fusos horários, trabalhadores com desajustamento quanto ao turno de trabalho e idosos. Touitou chama a atenção para suas pesquisas mais recentes que comprovaram, pela utilização do que ele chama de “marcadores de ritmos”, a existência de uma desincronização muito importante em portadores de câncer de mama, ovário e próstata. A cronobiologia entra no tratamento desses pacientes na busca de uma harmonização entre tempo biológico e tempo astronômico. “Esse procedimento é muito importante, pois a ausência de concordância entre a hora da tomada de medicamentos e a hora biológica apropriada pode ter implicação quanto à maior ou menor eficácia do tratamento”, diz o pesquisador.

Tem hora para tudo

Despertar – entre 7h e 8h
A partir das 6h, o corpo produz um hormônio, o cortisol. Entre 7h e 8h, a taxa de cortisol no corpo atinge a concentração máxima. Faixa horária ideal para acordar com facilidade. Voltar a dormir é um erro. Por volta das 9h, o corpo começa a produzir endorfinas, que encorajam um sono pesado.

Prazer – entre 9h e 10h
A taxa de serotonina está em seu apogeu. O prazer experimentado só será aumentado. Boa hora para ir ao dentista: as endorfinas, em alta nesse horário, são anestésicos naturais.

Trabalho – entre 10h e 12h
O estado de vigilância atinge o seu pico e a memória de curto prazo está mais ativa. Momento para refletir, discutir idéias e encontrar inspiração.

Descanso – entre 13h e 14 h
A moleza de depois do almoço não se deve só à digestão, mas também a uma queda de adrenalina que desacelera o ritmo cardíaco.

Movimento – entre 15h e 16h
A forma física encontra o seu apogeu no meio da tarde, ao mesmo tempo em que a capacidade intelectual diminui. Como não há produção de hormônios específicos nesse horário, os cronobiologistas ainda não encontraram uma explicação para o fato.

Rush – entre 18h e 19h
O organismo fica mais vulnerável à poluição e ao monóxido de carbono a partir das 18h. Convém evitar os engarrafamentos. Nesse horário a atividade intelectual e o estado de vigilância atingem novo pico.

Happy hour – entre 20h e 21h
Quem costuma tomar aperitivo alcoólico antes do jantar deve saber que é o momento em que as enzimas do fígado estão menos ativas, o que faz com que se fique embriagado mais rápido.

Sono – a partir de 20h
A melatonina invade progressivamente o corpo a partir das 18h. Mas é às 20h que aparece o primeiro momento ideal para dormir, sucedido por outros iguais a cada duas horas.

Regeneração – entre 21h e 1h
Esta fase do sono é muito importante. Coincide com o pico da produção do hormônio do crescimento, indispensável para a renovação das células e a recuperação física. Esse hormônio permite que conhecimentos adquiridos na véspera sejam armazenados no cérebro.

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