Resolução protege médicos que prescreveram cloroquina
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Resolução do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRMDF) publicada no início dessa semana tem causado escândalo em parte da classe médica do país.
Com objetivo de proteger membros da categoria que prescrevem remédios sem eficácia comprovada e que até apresentam possíveis efeitos colaterais que podem ser fatais no tratamento da covid-19, o documento ainda sai em defesa do governo Jair Bolsonaro (sem partido) – que continua defendendo o “tratamento precoce” com substâncias vetadas pela comunidade científica.
“Ter transformado a pandemia em uma ferramenta política de agressão ao governo federal foi o que pior poderia ter acontecido na condução e enfrentamento da mesma”, diz o texto assinado pelo presidente do CRMDF, Farid Buitrago Sánchez.
Tomas Pinheiro da Costa, obstetra, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) se diz perplexo com atitudes como a tomada pelo CRMDF. Diretor do primeiro sindicato de profissionais liberais e de médicos do Brasil, o Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro (SinMed-RJ), Costa diz que na história dos Conselhos de Medicina do Brasil aconteceu uma reviravolta.
Conselhos deveriam defender os pacientes
Foto: Arquivo Pessoal
Ele destaca que a finalidade inicial desses órgãos era a defesa da ética. “Os conselhos, na verdade, para dar respeito à profissão, deveriam defender o cliente”, afirma.
Hoje ele vê o contrário. No objetivo de responder a visão de parte de seus associados, essas entidades passaram a defender a categoria, algo que é de responsabilidade dos sindicatos. “Os conselhos se voltaram para questões menores”, afirma.
Costa ainda lembra da atuação dos Conselhos de Medicina no caso do Programa Mais Médicos. “Se viraram contra o poder público quando este rompeu com amarras legais e colocou médicos em locais jamais imaginados do Brasil”, resume. No entendimento de Costa, isso acabou reforçando um ciclo “vicioso e viciado”. Ele entende ser um escândalo posturas como a do CRMDF.
Para o professor, existe uma defesa aberta e partidariamente do presidente da República que invadiu a competência dos próprios Conselhos ao “prescrever medicamentos”. Costa Fulmina: “Os conselhos baixaram a cabeça no exercício ilegal da medicina (por parte de Bolsonaro). Como é que vai ser agora em outros casos?”.
Obsessão de Bolsonaro
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A obsessão de Bolsonaro e seus seguidores em empurrar substâncias para um suposto tratamento precoce de pacientes infectados pelo novo coronavírus, apesar dos riscos que isso representa em termos de saúde pública, vem sendo recorrente desde o início da pandemia.
Mesmo não sendo médico e com um comportamento que extrapola as funções de chefe de Estado, o presidente apareceu inúmeras vezes em lives, fazendo propaganda explícita da hidroxicloroquina, um medicamento usado no tratamento de afecções reumáticas e artrites que pode provocar parada cardíaca e morte de pacientes covid-19. O Conselho Federal de Medicina (CFM), que tem a atribuição de fiscalizar o exercício ilegal da profissão, com a maioria das suas regionais sob o comando de bolsonaristas, nunca se manifestou.
Em dezembro, o Ministério da Saúde anunciou que gastar até R$ 250 milhões para oferecer o kit-Covid, que contém hidroxicloroquina e azitromicina – medicamentos potencialmente nocivos e sem eficácia comprovada contra a covid-19 e vetados pela comunidade científica para esse fim. O plano previa o reembolso às farmácias conveniadas para distribuição gratuita à população. A pasta tem um estoque superior a 2,5 milhões de comprimidos de hidroxicloroquina encalhados e, junto com o Exército, envolveu-se em um escândalo de superfaturamento de insumos investigado pelo MPF.