Pesquisador pede bom senso no ritmo da flexibilização
Foto: Feevale/Divulgação
Virologista, pesquisador e integrante da Rede Nacional de Monitoramento e Sequenciamento do Genoma do Coronavírus no Brasil, ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, Fernando Rosado Spilki conversou com o Extra Classe sobre o atual momento da pandemia da covid-19.
Segundo ele, há uma precipitação das autoridades, principalmente de governadores e prefeitos, que estão flexibilizando além do que os números permitem. Por outro lado, ele celebra os altos índices de vacinação no Brasil, apesar do atraso e recomenda cautela.
Spilki é doutor em Genética e Biologia Molecular, professor titular e pró-reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Extensão da Universidade Feevale, além de bolsista de Produtividade do CNPq. Atua na área de Virologia Básica, Animal, Humana e Ambiental e sua linha de pesquisa é na área de Desenvolvimento em Virologia. Recentemente recebeu o Prêmio Educação RS, concedido pelo Sindicato dos Professores do Ensino Privado (Sinpro/RS) pelo trabalho realizado à frente de diversos comitês relacionados com o enfrentamento à covid-19.
Em suas pesquisas, foi responsável por realizar exames de detecção desde o começo da pandemia, quando as informações eram insipientes. Liderou diversos trabalhos de pesquisa que possibilitaram dar à comunidade, inclusive nacionalmente, proposições quanto ao enfrentamento da doença, realizando estudos com novas variantes para que o combate fosse mais efetivo em todas as esferas.
Extra Classe – Quais questões referentes ao atual momento da pandemia no Brasil e no mundo não estão em pauta nos noticiários e na sociedade como deveriam estar?
Fernando Spilki – Não existem grandes mistérios neste momento. O que poderia estar ocupando mais espaço na mídia é o quanto determinadas liberações deveriam estar ocorrendo num prazo mais lento. E isso envolve diversas capitais do país. Há também a questão que envolve o uso ou não da máscara. Além disso, tem o fato de que parece que não estamos aprendendo em relação ao exemplo de outros países. A Alemanha, por exemplo, adotou algumas medidas em relação à liberação da máscara e não está dando certo. Isso nos mostra o quanto devemos ser mais cautelosos, ainda que, sim, estejamos num momento em que é possível avançar no sentido de que podemos ter mais atividades presenciais. Outra coisa, é algo que nós e muitos grupos de pesquisa vêm trabalhando, que é esta diversificação do vírus ainda que em números controlados e a necessidade de ainda ficarmos, enquanto sociedade, muito atentos com este processo para formação de variantes e sublinhagens para lá no futuro não termos problemas. Mas este ponto não é tão importante para a mídia, como é a discussão da sociedade sobre como nós deveríamos nos comportar para este período de retomada enquanto a pandemia ainda está ativa.
Foto: Feevale/Divulgação
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“Não existem grandes mistérios neste momento. O que poderia estar ocupando mais espaço na mídia é o quanto determinadas liberações deveriam estar ocorrendo num prazo mais lento. E isso envolve diversas capitais do país”
EC – Diante do que já se sabe, qual o prognóstico para 2022?
Spilki – É sempre um chute o prognóstico. É sempre uma aposta. Mas nós imaginamos a partir do que a gente tem vivido no Brasil – em relação a uma aderência que é acima da expectativa de uns meses atrás em relação à vacina –, que a gente espera um ambiente muito mais tranquilo para 2022. Mas isso desde que não sejamos novamente imprudentes para ultrapassar a proteção que a vacina tem conferido. Lembremos todos como foi o final do ano passado no verão.
EC – Existe risco de voltarmos a viver situações similares a 2020/2021 no auge da crise pandêmica?
Spilki – A nossa aposta não é a de voltarmos a ter aqueles números recordes e terríveis, especialmente de óbitos, que tivemos no primeiro semestre deste ano. Aquela foi uma situação que efetivamente revelou um descontrole muito grande e um fortíssimo efeito – primeiro por conta da facilidade com que a variante gama (a variante de Manaus se disseminou), por não estarmos adotando medidas efetivas de controle na maior parte do tempo. E, principalmente pelo atraso na vacinação. Agora, com a vacina, o horizonte é outro. Podem ocorrer novos picos se não forem tomados cuidados, principalmente quanto à lotação dos ambientes. É importante a continuidade da adoção do uso de máscara em ambientes fechados e abertos, onde possa ocorrer aglomeração de pessoas.
EC – O que fazer, então?
Spilki – É preciso manter o cuidado, o bom senso, as medidas pessoais de higiene e a continuidade da vacinação. A revacinação no ano que vem deve ser uma preocupação de todos. Neste meio tempo, precisamos ter o bom senso de em ambientes fechados continuar com o uso da máscara. Ter cuidado com a lotação dos ambientes e com que estejam arejados. No ambiente aberto, toda vez que houver aglomeração também usar máscara, mas antes de mais nada evitar a aglomeração o máximo que puder. Enfim, evitar eventos que possam ser inseguros. Sempre lembrado, ainda bem, estamos vacinados na maioria, mas aí nós temos o histórico do ano passado. O verão revelou que podemos ser muito imprudentes e pagarmos caro por isso mais uma vez.
EC – As autoridades estão cumprindo seu papel no enfrentamento ao Covid? Como o senhor vê as medidas de retorno, por exemplo das atividades escolares em diferentes níveis?
Spilki – Muitas autoridades estão sendo muito ansiosas. Há uma certa precipitação de alguns, principalmente no sentido de liberalização. Agora, reitero, um item importante é o uso da máscara. Nós deveríamos adotar e retomar medidas flexibilização mais intensas na medida em que fôssemos percebendo números de maior segurança. O que estamos vendo agora é uma endemização, ou seja, a gente não tem grandes picos, mas ainda há um número de casos num nível, apesar de bem mais baixos no histórico, ainda altos no contexto. Isto não é uma boa notícia. Isso não é o que nós queremos. Então, para que a gente consiga vencer isso, precisamos vacinar mais e evitar uma nova ressurgência do vírus, e, para isso, precisaríamos ser mais atentos e cuidadosos. E, neste sentido as autoridades têm ido além da conta, principalmente governadores e prefeitos das grandes capitais.