Pais se mobilizam pela redução do uso de celulares por adolescentes na Espanha
Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil
A proibição ou pelo menos a restrição ao uso de telefones celulares por adolescentes até os 16 anos de idade está mobilizando centenas de pais na Catalunha, Espanha. O movimento Adolescência sem celular lançou um alerta para as consequências nocivas do uso prolongado de telas representa para os jovens, como problemas de saúde, agressividade e isolamento social.
Mais do que uma iniciativa de controle parental, a campanha que em catalão se chama Adolescència sense mòbil, se espalhou por todo o país ibérico, com repercussões em vários países da Europa. Para o educador e pesquisador brasileiro Hugo Monteiro Ferreira, autor do livro A geração do quarto: quando crianças e adolescentes nos ensinam a amar (Record, 154p.), as bandeiras do movimento são universais, o que significa que esse tipo de mobilização não deve demorar a chegar ao Brasil.
Pós-doutor em Estudos da Criança pela Universidade do Minho, Portugal e doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Ferreira apoia a iniciativa e diz que a tendência é que ocorra uma onda de conscientização, com adaptação das restrições a cada tipo de sociedade.
“É bom ver que os pais não estão dormindo. Sou favorável ao movimento, só creio que precise de ajustes”, afirma o pesquisador.
No entanto, ele não deixa de ver uma certa ambivalência no Adolescència sense mòbil. “Num polo, é justa, é necessária a preocupação dos pais e das mães, uma vez que o uso excessivo é prejudicial ao desenvolvimento de crianças, adolescentes e jovens. Num outro polo, eu entendo que o uso dos celulares pelos adolescentes não é fruto de um comportamento alheio à família, à escola, à sociedade de modo geral”, reflete.
Movimento surge no desespero
Foto: Acervo Pessoal
Diante das séries de episódios de violência que vêm ocorrendo nas escolas, Monteiro Ferreira tem sido fonte de informações recorrente para a imprensa brasileira.
Para ele que já colocou em seu radar o movimento espanhol, é importante que se “ouvisse quem dele fala. Afinal, a decisão hierárquica não traz benefícios. É importante, essencial, envolver os adolescentes nesse movimento. Eles podem ser os grandes críticos das empresas neoliberais, voltadas exclusivamente para o lucro”.
Para ele, as informações a respeito do que ocorre na Espanha dão conta de que o movimento surge de cima para baixo, de forma autoritária, sem maiores discussões dos pais com seus filhos.
“No desespero. É fruto de uma ação exógena ao processo”, analisa.
Se o Adolescència sense mòbil também tem bases em uma onda moralizante, ele entende que é necessário se chegar na questão ética.
“O certo é que se pode dizer que 60% dos conteúdos violentos apresentados na internet são vistos por pessoas menores de 18 anos. Pesquisas empíricas indicam que entre dez adolescentes, oito veem ou já viram ao menos três vezes pornografia”, ilustra.
Como começou
O movimento surgiu no início do ano letivo europeu que começou entre agosto e setembro.
Nas ilhas Baleares, arquipélago localizado na costa Leste da Espanha, no Mediterrâneo, iniciativa mobilizou Laura Moyà e Xim Fuster, pais de uma adolescente que chegou ao ensino secundário sem ter um telefone celular.
O movimento reuniu mais de mil pais em apenas 24 horas, demonstrando a preocupação com o acesso cada vez mais precoce das crianças e adolescentes aos dispositivos móveis.
Pais e mães de Barcelona formaram um grupo de discussão on-line para sensibilizar outros tutores sobre a necessidade de debater o acesso de menores a celulares com acesso à internet.
“Quer lutar contra a pressão social que normaliza dar um celular ao seu filho quando ele vai para a escola? Quer conhecer alternativas para não ter que fazer isso?”, era o teor de um post que foi distribuído.
Em pouco tempo o grupo originalmente criado no WhatsApp ultrapassou os limites e teve que abrir outra frente no Telegram.
Em alguns dias, os pouco participantes, chegaram a sete mil e o grupo inicial deu origem a 110 novos grupos, dos quais 53 só na região da Catalunha, e os demais no resto da Espanha.